O documento Strategies to prevent catheter-associated urinary tract infections in acute-care hospitals: 2022 Update foi desenvolvido seguindo o processo descrito do Manual para Diretrizes Patrocinadas pela SHEA e Documentos de Orientação Especializada. Nenhuma diretriz ou documento de orientação especializada pode prever todas as situações clínicas, e este documento não pretende substituir o julgamento clínico individual por profissionais qualificados. O seu foco é a prevenção de infecções do trato urinário associadas a cateteres (ITUAC) em hospitais de cuidados agudos. Abaixo a equipe da IntraMed Brasil traz um resumo sobre os principais pontos.
Definição da ITUAC |
Como o diagnóstico clínico é por exclusão, é difícil estabelecer uma definição padronizada para a ITUAC. No entanto, a descrição ideal é aquela que captura apenas casos reais de infecção sintomática que se beneficiariam de tratamento antimicrobiano. De acordo com a National Healthcare Safety Network (NHSN) pode ser classificada com a exclusão de leveduras como patógeno e o aumento do limiar bacteriano da urocultura para ≥10⁵ unidades formadoras de colônia por mililitro (UFC/mL).
Resultados da ITUAC |
Atualmente, os cateteres urinários continuam sendo um dos dispositivos médicos mais comumente utilizados em departamentos de emergência e hospitais. Muitas vezes, são colocados e mantidos em uso sem indicação clínica adequada para justificar o seu risco em comparação ao potencial benefício.
Em 2003, 70% a 80% das infecções do trato urinário (ITUs) foram atribuídas à presença de um cateter uretral permanente, no entanto, ao longo do tempo diminuíram, chegando em média a 44% em 2019. As taxas de ITU-AC relatadas em 2020 para instituições que reportaram ao National Healthcare Safety Network (NHSN) foram de 0,754 por 1.000 dias de cateter para unidades de internação adulta.
A infecção é apenas um dos vários resultados adversos do uso de cateteres urinários. Complicações não infecciosas incluem inflamação uretral não bacteriana, estenoses uretrais, trauma mecânico e comprometimento da mobilidade.
O uso inadequado de uroculturas pode aumentar as taxas de ITUAC. Para evitar isso, é necessária uma revisão contínua e detalhada das anotações médicas e/ou de enfermagem no prontuário eletrônico, para observar o número de cateteres urinários em uso, uroculturas solicitadas e antimicrobianos prescritos. O tratamento inadequado pode promover a resistência antimicrobiana e infecções por Clostridioides difficile em instituições de cuidados agudos.
Fatores de risco |
1. Duração da cateterização: é necessário reduzir a colocação desnecessária de cateteres e minimizar a duração da cateterização.
2. Sexo feminino, idade avançada e a não manutenção de um sistema de drenagem fechado.
3. Fatores de risco para desenvolver infecção da corrente sanguínea relacionada ao trato urinário associada a cuidados de saúde incluem neutropenia, doença renal e sexo masculino.
Prevenção da ITUAC |
Dado o número de oportunidades de intervenção para reduzir as complicações associadas ao cateter urinário, um modelo conceitual conhecido como “Interrompendo o Ciclo de Vida do Cateter Urinário” pode ajudar a avaliar a abrangência das estratégias de um hospital ou unidade de saúde para prevenir complicações associadas ao cateter, incluindo ITUAC.
Como ilustrado na Figura 1, o passo mais importante (0) é evitar a colocação do cateter urinário permanente sempre que possível. Esse inclui a adoção de estratégias de manejo urinário sem cateter, como o estímulo para urinar, uso de urinóis, comadres de beira de leito e fraldas de incontinência, e/ou estratégias sem cateter permanente, como cateterização intermitente (CII) ou consideração do uso de cateteres urinários externos (CUE).
Figura 1. Interrompendo o ciclo de vida do cateter uretral permanente para reduzir a infecção e o trauma associados ao cateter. Adaptada de Patel e colaboradores (2023).
> Práticas para todos os hospitais de cuidados agudos
• Realizar uma avaliação de risco de ITUAC e implementar um programa institucional para identificar e remover cateteres desnecessários.
• Fornecer infraestrutura adequada para prevenir ITUAC, como materiais de gestão urinária não invasivos, por exemplo, scanners de bexiga e cateteres externos.
• Implementar protocolos baseados em evidências para as etapas do ciclo de vida do cateter: adequação, técnica de inserção, cuidados de manutenção e remoção.
• Certificar-se de que apenas profissionais treinados insiram cateteres urinários e que sua competência seja avaliada regularmente.
• Garantir que os suprimentos necessários para a técnica asséptica estejam disponíveis e acessíveis.
• Implementar um sistema para documentar no prontuário do paciente a ordem médica para colocação do cateter, sua justificativa, data e hora, nome do responsável, manutenção e remoção.
• Assegurar que recursos humanos e tecnológicos sejam suficientes para apoiar a vigilância do uso de cateteres e resultados.
• Realizar vigilância da ITUAC conforme indicado com base na avaliação de risco da instituição.
• Padronizar a cultura de urina.
> Educação e treinamento
• Educar e avaliar as competências dos profissionais de saúde envolvidos na inserção, cuidado e manutenção de cateteres urinários sobre a prevenção de ITU-AC.
• Educar os profissionais de saúde sobre a importância da gestão adequada de culturas de urina e fornecer indicações apropriadas para a sua realização.
• Treinar para a coleta adequada de urina. As amostras devem ser enviadas ao laboratório microbiológico o mais rápido possível, preferencialmente em até uma hora. Caso haja atraso, as amostras devem ser refrigeradas (não mais que 24 horas) ou coletadas em tubos de transporte com preservativos.
• Treinar os clínicos para considerar outros métodos de manejo da bexiga (ex: cateterismo intermitente ou dispositivos externos de coleta).
> Inserção e gerenciamento de catetes permanentes
• Inserir cateteres urinários apenas quando necessário. É importante considerar outros métodos, como cateterismo intermitente ou dispositivos externos de coleta.
• Trabalhar em pares para ajudar no posicionamento do paciente e monitorar possíveis contaminações durante a colocação do cateter.
• Praticar higiene das mãos imediatamente antes da inserção do cateter.
• Inserir cateteres seguindo técnica asséptica e utilizando equipamentos estéreis.
• Usar um cateter com o menor diâmetro possível compatível com a drenagem adequada, a fim de minimizar o trauma uretral.
• Fixar adequadamente os cateteres permanentes após a inserção para evitar movimentação e tração uretral.
• Manter um sistema de drenagem estéril e continuamente fechado.
• Substituir o cateter e o sistema de coleta utilizando técnica asséptica quando ocorrerem quebras na técnica asséptica, desconexões ou vazamentos.
• Para exame de urina fresca, coletar uma pequena amostra aspirando a urina do porto de amostragem sem agulha com uma seringa ou adaptador estéril, após limpar o porto com desinfetante.
• Manter o fluxo urinário desobstruído.
• Empregar higiene de rotina.
Conclusão |
A implementação das estratégias para prevenir infecções do trato urinário associadas a cateteres é fundamental para garantir a segurança dos pacientes em hospitais de cuidados agudos. Este documento forneceu um conjunto abrangente de recomendações que visam não apenas a redução das taxas de infecção, mas também a melhoria geral da qualidade dos cuidados prestados. Ao adotar práticas baseadas em evidências e promover a educação contínua entre os profissionais de saúde, é possível interromper o ciclo de complicações associadas ao uso inadequado de cateteres.