Prática clínica

Estratégias para prevenir infecções urinárias associadas a cateteres

As recomendações do documento são essenciais à prática de todos os hospitais de cuidados agudos

Autor/a: Patel PK, Advani SD, Kofman AD, et al.

Fuente: Infection Control & Hospital Epidemiology. 2023;44(8):1209-1231. doi:10.1017/ice.2023.137 Strategies to prevent catheter-associated urinary tract infections in acute-care hospitals: 2022 Update

O documento Strategies to prevent catheter-associated urinary tract infections in acute-care hospitals: 2022 Update foi desenvolvido seguindo o processo descrito do Manual para Diretrizes Patrocinadas pela SHEA e Documentos de Orientação Especializada. Nenhuma diretriz ou documento de orientação especializada pode prever todas as situações clínicas, e este documento não pretende substituir o julgamento clínico individual por profissionais qualificados. O seu foco é a prevenção de infecções do trato urinário associadas a cateteres (ITUAC) em hospitais de cuidados agudos. Abaixo a equipe da IntraMed Brasil traz um resumo sobre os principais pontos.

Definição da ITUAC

Como o diagnóstico clínico é por exclusão, é difícil estabelecer uma definição padronizada para a ITUAC. No entanto, a descrição ideal é aquela que captura apenas casos reais de infecção sintomática que se beneficiariam de tratamento antimicrobiano. De acordo com a National Healthcare Safety Network (NHSN) pode ser classificada com a exclusão de leveduras como patógeno e o aumento do limiar bacteriano da urocultura para ≥10⁵ unidades formadoras de colônia por mililitro (UFC/mL).

Resultados da ITUAC

Atualmente, os cateteres urinários continuam sendo um dos dispositivos médicos mais comumente utilizados em departamentos de emergência e hospitais. Muitas vezes, são colocados e mantidos em uso sem indicação clínica adequada para justificar o seu risco em comparação ao potencial benefício.

Em 2003, 70% a 80% das infecções do trato urinário (ITUs) foram atribuídas à presença de um cateter uretral permanente, no entanto, ao longo do tempo diminuíram, chegando em média a 44% em 2019. As taxas de ITU-AC relatadas em 2020 para instituições que reportaram ao National Healthcare Safety Network (NHSN) foram de 0,754 por 1.000 dias de cateter para unidades de internação adulta.

A infecção é apenas um dos vários resultados adversos do uso de cateteres urinários. Complicações não infecciosas incluem inflamação uretral não bacteriana, estenoses uretrais, trauma mecânico e comprometimento da mobilidade.

O uso inadequado de uroculturas pode aumentar as taxas de ITUAC. Para evitar isso, é necessária uma revisão contínua e detalhada das anotações médicas e/ou de enfermagem no prontuário eletrônico, para observar o número de cateteres urinários em uso, uroculturas solicitadas e antimicrobianos prescritos. O tratamento inadequado pode promover a resistência antimicrobiana e infecções por Clostridioides difficile em instituições de cuidados agudos.

Fatores de risco

1. Duração da cateterização: é necessário reduzir a colocação desnecessária de cateteres e minimizar a duração da cateterização.

2. Sexo feminino, idade avançada e a não manutenção de um sistema de drenagem fechado.

3. Fatores de risco para desenvolver infecção da corrente sanguínea relacionada ao trato urinário associada a cuidados de saúde incluem neutropenia, doença renal e sexo masculino.

Prevenção da ITUAC

Dado o número de oportunidades de intervenção para reduzir as complicações associadas ao cateter urinário, um modelo conceitual conhecido como “Interrompendo o Ciclo de Vida do Cateter Urinário” pode ajudar a avaliar a abrangência das estratégias de um hospital ou unidade de saúde para prevenir complicações associadas ao cateter, incluindo ITUAC.

Como ilustrado na Figura 1, o passo mais importante (0) é evitar a colocação do cateter urinário permanente sempre que possível. Esse inclui a adoção de estratégias de manejo urinário sem cateter, como o estímulo para urinar, uso de urinóis, comadres de beira de leito e fraldas de incontinência, e/ou estratégias sem cateter permanente, como cateterização intermitente (CII) ou consideração do uso de cateteres urinários externos (CUE).

Figura 1. Interrompendo o ciclo de vida do cateter uretral permanente para reduzir a infecção e o trauma associados ao cateter. Adaptada de Patel e colaboradores (2023).

> Práticas para todos os hospitais de cuidados agudos

• Realizar uma avaliação de risco de ITUAC e implementar um programa institucional para identificar e remover cateteres desnecessários.

Fornecer infraestrutura adequada para prevenir ITUAC, como materiais de gestão urinária não invasivos, por exemplo, scanners de bexiga e cateteres externos.

Implementar protocolos baseados em evidências para as etapas do ciclo de vida do cateter: adequação, técnica de inserção, cuidados de manutenção e remoção.

Certificar-se de que apenas profissionais treinados insiram cateteres urinários e que sua competência seja avaliada regularmente.

Garantir que os suprimentos necessários para a técnica asséptica estejam disponíveis e acessíveis.

Implementar um sistema para documentar no prontuário do paciente a ordem médica para colocação do cateter, sua justificativa, data e hora, nome do responsável, manutenção e remoção.

Assegurar que recursos humanos e tecnológicos sejam suficientes para apoiar a vigilância do uso de cateteres e resultados.

Realizar vigilância da ITUAC conforme indicado com base na avaliação de risco da instituição.

• Padronizar a cultura de urina.

> Educação e treinamento

• Educar e avaliar as competências dos profissionais de saúde envolvidos na inserção, cuidado e manutenção de cateteres urinários sobre a prevenção de ITU-AC.

• Educar os profissionais de saúde sobre a importância da gestão adequada de culturas de urina e fornecer indicações apropriadas para a sua realização.

• Treinar para a coleta adequada de urina. As amostras devem ser enviadas ao laboratório microbiológico o mais rápido possível, preferencialmente em até uma hora. Caso haja atraso, as amostras devem ser refrigeradas (não mais que 24 horas) ou coletadas em tubos de transporte com preservativos.

Treinar os clínicos para considerar outros métodos de manejo da bexiga (ex: cateterismo intermitente ou dispositivos externos de coleta).

> Inserção e gerenciamento de catetes permanentes

Inserir cateteres urinários apenas quando necessário. É importante considerar outros métodos, como cateterismo intermitente ou dispositivos externos de coleta.

• Trabalhar em pares para ajudar no posicionamento do paciente e monitorar possíveis contaminações durante a colocação do cateter.

 Praticar higiene das mãos imediatamente antes da inserção do cateter.

Inserir cateteres seguindo técnica asséptica e utilizando equipamentos estéreis.

Usar um cateter com o menor diâmetro possível compatível com a drenagem adequada, a fim de minimizar o trauma uretral.

• Fixar adequadamente os cateteres permanentes após a inserção para evitar movimentação e tração uretral.

Manter um sistema de drenagem estéril e continuamente fechado.

• Substituir o cateter e o sistema de coleta utilizando técnica asséptica quando ocorrerem quebras na técnica asséptica, desconexões ou vazamentos.

Para exame de urina fresca, coletar uma pequena amostra aspirando a urina do porto de amostragem sem agulha com uma seringa ou adaptador estéril, após limpar o porto com desinfetante.

Manter o fluxo urinário desobstruído.

 Empregar higiene de rotina.

Conclusão

A implementação das estratégias para prevenir infecções do trato urinário associadas a cateteres é fundamental para garantir a segurança dos pacientes em hospitais de cuidados agudos. Este documento forneceu um conjunto abrangente de recomendações que visam não apenas a redução das taxas de infecção, mas também a melhoria geral da qualidade dos cuidados prestados. Ao adotar práticas baseadas em evidências e promover a educação contínua entre os profissionais de saúde, é possível interromper o ciclo de complicações associadas ao uso inadequado de cateteres.