Manifestações e abordagem clínica

Psoríase: uma breve revisão

Uma doença de pele clinicamente heterogênea que ocorre em vários locais e de várias formas

Autor/a: Antony Raharja, Satveer K Mahil and Jonathan N Barker

Fuente: Psoriasis: a brief overview

Resumo

A psoríase é uma doença cutânea clinicamente heterogênea ao longo da vida que se apresenta em várias formas, incluindo placa, ungueal, gutata, pustular ou eritrodérmica. Estima-se que 60 milhões de pessoas tenham psoríase em todo o mundo, com 1,52% da população em geral afetada no Reino Unido. Uma doença inflamatória imunomediada, a psoríase tem um importante componente genético. Sua associação com artrite psoriática e taxas aumentadas de comorbidade cardiometabólica, hepática e psicológica requer uma abordagem abrangente e multidisciplinar do cuidado.

Os tratamentos para psoríase incluem agentes tópicos (análogos da vitamina D e corticosteroides), fototerapia (radiação ultravioleta B de banda estreita (NB-UVB) e psoraleno e radiação ultravioleta A (PUVA)), agentes sistêmicos padrão (metotrexato, ciclosporina e acitretina), biológicos (fator de necrose tumoral/TNF), inibidores de interleucina (IL-17 e IL-23) ou terapias com inibidores de moléculas pequenas (fumarato de dimetila e apremilaste). Avanços na compreensão de sua fisiopatologia levaram ao desenvolvimento de tratamentos altamente eficazes e específicos.

Pontos chave

  • A psoríase é uma doença inflamatória crônica da pele imunomediada com vários subtipos fenotipicamente distintos, por exemplo, placa, ungueal, gutata, pustular ou eritrodérmica.
  • A psoríase tem um importante componente genético, com uma herdabilidade estimada de 60-90%.
  • Os locais de psoríase de alto impacto e de difícil tratamento incluem couro cabeludo, rosto, unhas, órgãos genitais, palmas das mãos e solas dos pés.
  • O reconhecimento e o tratamento de comorbidades (como artrite psoriática, doenças psicológicas, cardiovasculares e hepáticas) é uma parte essencial do cuidado integral das pessoas com psoríase.
  • Os tratamentos para psoríase incluem terapias tópicas (análogos da vitamina D e corticosteroides), fototerapia (radiação ultravioleta B de banda estreita (NB-UVB) e psoraleno e radiação ultravioleta A (PUVA)), agentes sistêmicos convencionais (metotrexato, ciclosporina e acitretina), produtos biológicos direcionados (fator de necrose tumoral/TNF), inibidores de interleucina (IL-17 e IL-23) e inibidores orais de pequenas moléculas (fumarato de dimetila e apremilaste).
 
Introdução

A psoríase é uma doença inflamatória da pele imune vitalícia associada a doenças como a artropatia psoriática, doenças psicológicas, cardiovasculares e hepáticas.

Em 2014, a Organização Mundial da Saúde reconheceu a psoríase como uma doença grave não transmissível e destacou a angústia relacionada ao diagnóstico incorreto, tratamento inadequado e estigmatização da doença.

Epidemiologia

A psoríase afeta homens e mulheres, com início mais precoce em mulheres e pessoas com histórico familiar. Sua idade de início mostra uma distribuição bimodal com picos em 30-39 anos e 60-69 anos em homens e 10 anos antes em mulheres.

Estima-se que 60 milhões de pessoas tenham psoríase em todo o mundo, com uma prevalência específica de cada país variando de 0,05% da população geral em Taiwan a 1,88% na Austrália. É mais comum em áreas de alta renda e naquelas com populações mais velhas. No Reino Unido, afeta 1,52% da população em geral.

Etiologia

A patogênese da psoríase é multifatorial, com a genética sendo um dos principais contribuintes, especialmente naqueles com psoríase em placas de início precoce (<40 anos). Isso foi demonstrado por estudos de gêmeos, famílias e em larga escala em nível populacional, com uma herdabilidade estimada de 60-90%.

Agora, mais de 60 loci de suscetibilidade foram identificados por meio de estudos de associação do genoma. Muitos dos genes candidatos estão envolvidos na apresentação de antígenos (HLA-C e ERAP1), sinalização de NF-kappa B (TNIP1), a via do interferon tipo 1 (RNF113 e IFIH1), o eixo da interleucina (IL-23/Th17, IL23R, IL12B e TYK2) e a função de barreira da pele (LCE3).

Isso sugere uma interação complexa entre células T, células dendríticas e queratinócitos como a provável causa subjacente da fisiopatologia da psoríase, com o eixo IL-23/Th17 sendo o condutor central da ativação imune, a proliferação de queratinócitos.

Os gatilhos ambientais são conhecidos por exacerbar a psoríase, como obesidade, estresse, betabloqueadores, tabagismo e lítio.

Embora haja uma relativa escassez de dados, a psoríase pustulosa parece ser geneticamente distinta, com diferentes genes de suscetibilidade envolvidos (IL36RN, AP1S3 em descendentes de europeus e CARD14).

Apresentações clínicas

A psoríase se manifesta de várias maneiras:

A forma mais comum é a psoríase em placas, que se apresenta como placas rosa-salmão bem definidas com escamas branco-prateadas, tipicamente em uma distribuição simétrica e afetando as superfícies extensoras (especialmente cotovelos e joelhos), tronco e couro cabeludo (Fig 1). Os pontos de sangramento podem ser vistos onde as escamas foram removidas (sinal de Auspitz).

Figura 1: Psoríase crônica em placas com placas eritematosas, escamosas, disseminadas, simetricamente distribuídas e bem demarcadas. As superfícies dos extensores, como cotovelos e joelhos, são freqüentemente afetadas.

A psoríase invertida atinge principalmente áreas úmidas como axilas, virilhas, embaixo dos sérios e ao redor dos genitais. Não apresenta muita descamação.

A psoríase gutata causa uma erupção simétrica aguda de pápulas/placas em gotículas que afetam principalmente o tronco e as extremidades, classicamente, mas nem sempre, precedida por infecção estreptocócica. Pacientes com psoríase gutata podem desenvolver posteriormente psoríase em placas.

Em casos raros de doença grave não controlada, a psoríase causa erupção cutânea eritematosa generalizada com risco de vida (eritrodermia) devido a complicações potenciais, incluindo hipotermia, risco de infecção, lesão renal aguda e insuficiência cardíaca de alto débito. O fenômeno de Koebner descreve o aparecimento de psoríase em áreas da pele afetadas por traumas.

A psoríase ungueal afeta as unhas das mãos e dos pés. A unha cresce de forma anormal, de modo que fica grossa, escamosa, mude de cor e pode até deformar.

A psoríase pustulosa pode apresentar manchas, bolhas ou pústulas em todas as partes do corpo ou em áreas menores, como mãos, pés ou dedos poucas horas após a pele torna-se vermelha. As bolas secam dentro de 1 ou 2 dias, mas podem reaparecer. A psoríase pustulosa generalizada pode apresentar febre, calafrios, coceira e fadiga.

A psoríase artropática é conhecida por causar fortes dores nas articulações, além da inflamação na pele e da descamação. Afeta normalmente articulações dos dedos dos pés e mãos, coluna e juntas dos quadris e pode causar rigidez progressiva e até deformidades permanentes.

A psoríase eritrodérmica é a menos comum e é conhecida por acometer todo o corpo com manchas vermelhas que podem arder ou coçar intensamente, levando a manifestações sistêmicas. Pode ser desencadeada por queimaduras, tratamentos intempestivos, infecções ou por outro tipo de psoríase mal tratada.

Multimorbidade e psoríase

Pessoas com psoríase são mais propensas a sofrer de obesidade, doenças cardiovasculares, doença hepática gordurosa não-alcoólica, diabetes e síndrome metabólica do que a população em geral, e as taxas são especialmente altas nas pessoas com psoríase mais grave.

Isso pode estar relacionado a fatores genéticos, vias inflamatórias patogênicas e fatores de risco comuns.

A consequência é uma alta taxa de mortalidade em pacientes com psoríase grave, principalmente por causas cardiovasculares. Isso é potencialmente modificável, e o tratamento agressivo da psoríase demonstrou melhorar os desfechos cardiovasculares.

Além disso, as taxas de transtornos mentais (como ansiedade e depressão) também são altas em comparação com a população em geral, destacando o impacto psicossocial da psoríase.

Avaliação de pacientes com psoríase

A psoríase é avaliada pelo grau de envolvimento da pele (área de superfície corporal (ASC)) e pela gravidade do eritema, endurecimento e descamação. Na atenção secundária, pontuações validadas como o Índice de Gravidade da Área de Psoríase (PASI) e a Escala de Avaliação Global do Médico são rotineiramente usadas em conjunto com medidas de resultados relatados pelo paciente, como o Índice de Qualidade de vida em Dermatologia (DLQI).

A atenção ao seu impacto psicológico é essencial, pois pode contribuir para o desligamento e o abandono da terapia. Cada encontro com um paciente também é uma oportunidade para detectar multimorbidades.

Além de melhorar a saúde geral, o reconhecimento das multimorbidades pode influenciar a escolha do tratamento da psoríase. Por exemplo, a doença hepática crônica pode contra-indicar o uso de metotrexato. Portanto, uma abordagem multidisciplinar é crucial e frequentemente envolve reumatologistas, hepatologistas e psicólogos clínicos.

Tratamento a psoríase

As opções de tratamento para psoríase incluem terapia tópica, fototerapia ou tratamento sistêmico, e são descritas nas diretrizes do Instituto Nacional de Excelência em Saúde e Cuidados (NICE) do Reino Unido. Os objetivos do tratamento incluem uma melhora de pelo menos 75% ou 90% no PASI (PASI75 ou PASI90), resultando em pontuações PASI absolutas de ≤4 ou ≤2, respectivamente.

As terapias tópicas, como análogos da vitamina D ou corticosteroides, são de primeira linha. A eficácia do tratamento tópico pode ser aumentada com oclusão ou terapia combinada (por exemplo, calcipotriol/betametasona). As preparações de ditranol e alcatrão, anteriormente populares, são usadas com menos frequência, pois mancham e irritam a pele.

A psoríase em áreas de difícil tratamento (como por exemplo, couro cabeludo, rosto, unhas, genitais, palmas das mãos e plantas dos pés) merece atenção especial devido ao seu profundo impacto na função e sua resposta relativamente pobre ao tratamento (Fig. 2). O uso de esteróides para a face ou genitais deve ser de baixa potência e limitado ao uso em curto prazo devido ao risco de atrofia da pele e telangiectasia.

Figura 2: Psoríase afetando as palmas das mãos. A psoríase nas palmas das mãos, sola dos pés, couro cabeludo, rosto, unhas e órgãos genitais é difícil de tratar e pode ter um impacto profundo nas atividades da vida diária.

A terapia de segunda linha inclui fototerapia (radiação ultravioleta B de banda estreita (NB-UVB) e psoraleno com radiação ultravioleta A (PUVA)) e agentes sistêmicos convencionais (metotrexato, ciclosporina e acitretina). O NB-UVB substituiu amplamente o PUVA devido aos riscos de câncer de pele por doses cumulativas de PUVA.

O metotrexato atua inibindo os linfócitos por meio de vários mecanismos, incluindo a inibição da diidrofolato redutase, o bloqueio da aminoimidazol carboxamida ribotídeo transformilase (AICARTase) e o acúmulo de adenosina. Seu efeito adverso mais sério é a supressão da medula óssea. Outras complicações possíveis do tratamento incluem náusea, pneumonite, hepatite, fibrose hepática e teratogenicidade. O metotrexato é geralmente administrado por via oral todas as semanas. A formulação subcutânea causa menos efeitos colaterais gastrointestinais e é mais eficaz devido à sua maior biodisponibilidade.

A ciclosporina é um inibidor da calcineurina e tem um rápido início de ação, mas pode causar hipertensão e toxicidade renal irreversível. A acitretina é um retinóide oral que promove a diferenciação dos queratinócitos. Seus possíveis efeitos colaterais incluem pele seca, queda de cabelo, hiperlipidemia e hepatotoxicidade. Metotrexato e acitretina são contra-indicados durante a gravidez. Para doenças refratárias ao metotrexato e/ou ciclosporina ou quando as terapias de segunda linha não são adequadas, as terapias biológicas ou inibidores orais de pequenas moléculas podem ser considerados.

Os tratamentos biológicos são anticorpos monoclonais ou receptores solúveis que têm como alvo as citocinas pró-inflamatórias. Eles tiveram um impacto dramático nos resultados de doenças moderadas a graves. As terapias biológicas foram aprovadas para uso na psoríase moderada a grave, incluindo TNF (adalimumabe, etanercepte, infliximabe e certolizumabe), IL-12/23p40 (ustekinumabe), IL-23p19 (rizankizumabe, guselkumabe e tildrakizumabe), IL- 17 (ixecizumabe e secucinumabe) e inibidores do receptor de IL-17 (brodalumabe). Não existe um "melhor" agente único e a escolha do biológico deve ser adaptada às necessidades de cada paciente.

No momento, isso é influenciado principalmente por informações clínicas, por exemplo, fatores da psoríase (fenótipo da doença e genética), comorbidades (doença desmielinizante e doença inflamatória intestinal), fatores específicos do medicamento (frequência de dosagem) e considerações sobre estilo de vida (planos de concepção). A informação genômica tem o potencial de guiar a implantação efetiva de terapias no futuro, e este é um campo ativo de pesquisa.

Embora muito eficazes, os produtos biológicos requerem administração subcutânea ou intravenosa regular. Inibidores orais de pequenas moléculas, como apremilast (inibidor de fosfodiesterase 4) e fumarato de dimetila, são licenciados para uso em psoríase moderada a grave, e os ensaios estão em andamento para pequenas moléculas que bloqueiam a tirosina quinase 2 em Janus quinase (JAK), transdutor de sinal e ativador de proteínas de transcrição (STAT).

Conclusão

Em resumo, a psoríase é uma doença inflamatória cutânea comum, predominantemente determinada por fatores genéticos e associada a comorbidades médicas e psicossociais significativas. Os avanços na compreensão de sua fisiopatologia levaram a um número crescente de opções terapêuticas que podem melhorar drasticamente a vida das pessoas com psoríase.