As bactérias intestinais afetam vários órgãos do corpo humano. Elas podem modular o comportamento do organismo através da síntese de diversos compostos químicos, como a serotonina e precursores de neurotransmissores, além de afetarem o metabolismo e a imunidade. A composição quantitativa e qualitativa correta da microbiota intestinal—referida como eubiose—é essencial para a manutenção da homeostase e, portanto, da saúde, enquanto a disbiose pode causar ou agravar o curso de várias patologias.
A translocação anormal da microbiota intestinal do intestino grosso para o intestino delgado pode resultar na síndrome de supercrescimento bacteriano do intestino delgado, abreviada como SIBO. Em estado fisiológico, existem mecanismos que previnem a colonização excessiva de bactérias no órgão, como o pH ácido do estômago, enzimas pancreáticas, o sistema imunológico intestinal, a peristalse do intestino delgado, a válvula ileocecal e a própria barreira intestinal. No entanto, quando ocorrem alterações em qualquer um desses mecanismos, o SIBO pode se desenvolver. A proliferação excessiva de bactérias fermentadoras de carboidratos, que levam à produção de gases no intestino delgado, pode causar o acúmulo de carboidratos, bem como de outros produtos do metabolismo bacteriano, resultando em desconforto.
Diversos fatores de risco para a doença podem ter citados, como: hipocloridria (ou seja, redução da secreção de suco gástrico, que ocorre fisiologicamente em idosos), uso prolongado de inibidores de bomba de prótons (IBPs) e/ou colonização por Helicobacter pylori (H. pylori), levando à disbiose no estômago e intestino delgado. Ademais, procedimentos cirúrgicos abdominais e pélvicos também foram relatados como fatores predisponentes.
O espectro dos sintomas do SIBO inclui não apenas aqueles que afetam o trato digestivo (por exemplo, diarreia crônica aquosa/gordurosa, inchaço, dor abdominal, constipação, distúrbios de absorção, desnutrição, perda de peso, alterações inflamatórias nos intestinos e atrofia das vilosidades intestinais). Eles também abrangem dores de cabeça, alterações de humor, mal-estar geral, deficiências vitamínicas (B12, B1, B3), níveis elevados de vitamina K e ácido fólico, acidose D-láctica, sintomas cutâneos, alterações hepáticas e artralgia.
Doenças relacionadas ao SIBO |
> Síndrome do intestino irritável
A síndrome do intestino irritável (SII) é o distúrbio digestivo mais comum. Estima-se que a incidência de proliferação bacteriana no intestino delgado de pacientes com SII seja de 51,7%, em comparação com 16,7% em indivíduos saudáveis. Diversos estudos relataram que a taxa de SIBO positiva em pacientes com SII aumentou significativamente e que a erradicação dessas bactérias no intestino delgado pode melhorar os sintomas experimentados por esses pacientes. Além disso, pacientes com SII e SIBO apresentam sintomas gastrointestinais mais graves.
Nesses casos, a microbiota, geralmente, é dominada por espécies do gênero Prevotella, que produzem enzimas responsáveis pela fermentação de carboidratos, processo através do qual não apenas hidrogênio e metano são formados, mas também ácidos graxos de cadeia curta e lipopolissacarídeos (LPS), que, quando presentes na parede celular, podem induzir inflamação nos enterócitos. A ativação do sistema imunológico e a inflamação prolongada na mucosa intestinal durante o curso da SII aumentam a permeabilidade vascular intestinal, enquanto a SIBO também induz a atividade do sistema imunológico.
> Doença de Crohn (DC) e Colite Ulcerativa (CU)
A doença de Crohn (DC), um tipo de doença inflamatória intestinal (DII), é um distúrbio inflamatório persistente e irreversível, com causa desconhecida, caracterizado por períodos de remissão e recaída. O SIBO parece ser uma condição comum em pacientes com DC, com prevalência estimada entre 25% e 88%, sendo predominante em pacientes com fístulas gastro-cólicas ou jejuno-cólicas, estase de conteúdo intestinal, refluxo colo-ileal causado pela perda da válvula ileocecal, alça cega cirúrgica, obstrução intestinal e diferentes tipos de distúrbios de motilidade. Essas bactérias no intestino delgado em pacientes com DC foi associado a uma forma mais grave da doença e a mudanças significativas na microbiota intestinal, o que pode agravar os sintomas e o curso da doença.
A colite ulcerativa (CU), uma condição inflamatória não específica, é uma doença inflamatória crônica do reto e cólon, cuja patogênese ainda não foi elucidada. A secreção de citocinas pró-inflamatórias na enfermidade pode resultar no desenvolvimento de SIBO, o que aumenta os níveis de endotoxinas sanguíneas, bem como os receptores TLR2 e TLR4. Os efeitos sinérgicos dessas mediariam a inflamação sistêmica e poderiam estar envolvidos na progressão da doença. Observou-se que a erradicação das bactérias com o uso de rifaximina reduziu os sintomas tanto em pacientes com DC quanto com CU.
> Doença celíaca
A doença celíaca (CeD) é uma enteropatia autoimune desencadeada pela ingestão de glúten em indivíduos geneticamente suscetíveis. A sua conexão com o SIBO parece evidente: a disbiose intestinal pode afetar a motilidade gastrointestinal e vice-versa. Pacientes com CeD apresentam uma diminuição na colecistoquinina e um aumento esporádico de neurotensina, hormônios que influenciam positiva e negativamente a motilidade gastrointestinal, respectivamente. Além disso, a terapia com rifaximina levou à remissão dos sintomas em pacientes que não respondiam ao tratamento com uma dieta livre de glúten.
> Doença hepática gordurosa não alcoólica
A doença hepática gordurosa não alcoólica (MAFLD) é uma condição crônica associada ao acúmulo patológico de lipídios nos hepatócitos. Evidências crescentes apontam para a associação entre SIBO e MAFLD, com uma conexão intensificada pelo eixo intestino-fígado, visto que ambas as doenças compartilham vias de sinalização comuns. As consequências do SIBO incluem distúrbios de má absorção (como deficiência de vitamina B12, ferro, colina, gorduras, carboidratos e proteínas) e desconjugação de sais biliares. Quando o supercrescimento não é detectado pode levar à desnutrição, prejudicando diretamente a função hepática.
Estudos indicam uma frequência elevada de SIBO em pacientes com MAFLD, inclusive em crianças. Sendo assim, o supercrescimento bacteriano pode ser um fator fisiopatológico na progressão da doença hepática, ao alterar a permeabilidade intestinal e permitir a entrada de endotoxinas bacterianas na circulação.
> Cirrose hepática
A cirrose hepática é caracterizada por comprometimento da motilidade intestinal, trânsito intestinal retardado, insuficiência pancreática exócrina e/ou distúrbios imunológicos.
O SIBO é frequente em pacientes com cirrose hepática, sendo detectado em até 51,5% dos casos estudados. Além disso, pacientes com hepatopatias frequentemente apresentam comorbidades como diabetes e neuropatia autonômica, o que aumenta a ocorrência de SIBO. A cirrose causa disbiose, com aumento de bactérias do gênero Proteobacteria, que produzem endotoxinas ativas, e de bactérias anaeróbicas do gênero Bacilli, que podem translocar bactérias. Por outro lado, ocorre uma diminuição nas bactérias do gênero Clostridium.
Nos pacientes com SIBO, predominam bactérias do gênero Blautia, capazes de converter ácidos biliares primários em ácidos biliares secundários. Alterações no metabolismo biliar, como a desconjugação aumentada de ácidos graxos primários no intestino delgado, são comuns, resultando em menor afinidade desses ácidos por proteínas e favorecendo sua absorção através do epitélio do íleo terminal. Estudos também mostraram que o SIBO em cirróticos está associado à encefalopatia hepática, uma complicação grave da doença.
> Pancreatite
Relatos apontam uma maior incidência de SIBO em pacientes com pancreatite crônica e aguda, embora apenas pequenos grupos de pacientes tenham sido estudados. O supercrescimento bacteriano pode complicar a primeira, interferindo em seu manejo clínico. Demonstrou-se que a disfunção da barreira intestinal permite que bactérias se transfiram para órgãos extraintestinais, levando à sepse e a doenças infecciosas subsequentes, que apresentam altas taxas de mortalidade.
Estudos indicaram que a presença de SIBO na pancreatite aguda está correlacionada com a gravidade da doença. O supercrescimento é frequentemente encontrado em pacientes com a doença crônica que apresentam esteatorreia persistente, mesmo com terapia de reposição enzimática pancreática.
> Esclerose sistêmica
A esclerose sistêmica (SSc) é uma doença crônica do tecido conjuntivo de origem autoimune, que leva à fibrose de órgãos. O SIBO ocorre com prevalência de aproximadamente 39% a 62% dos pacientes com SSc, apresentando sintomas inespecíficos no trato gastrointestinal (distensão, dor, constipação, diarreia). A motilidade intestinal anormal, o tempo de trânsito orocecal (OCTT) prolongado e a depuração intestinal comprometida são fatores que contribuem para o desenvolvimento de SIBO.
Os dados revelam uma forte ligação entre as duas condições, com prevalência 10 vezes maior de SIBO em pacientes com SSc em comparação com controles saudáveis. Além disso, o risco de diarreia foi maior em pacientes com ambas as condições do que naqueles sem o supercrescimento.
Os sintomas intestinais podem estar relacionados a essa síndrome, e sua erradicação parece útil para melhorar os sintomas clínicos. O OCTT é significativamente prolongado em pacientes com SSc, sugerindo comprometimento da motilidade intestinal, outro fator de risco para o desenvolvimento de SIBO. Outros estudos também mostraram que a velocidade através do intestino delgado é significativamente reduzida em pacientes com SSc que apresentam sintomas abdominais difusos.
Diferenças no microbioma fecal foram relatadas entre pacientes com SSc e SIBO e aqueles sem a segunda condição. A análise mostrou diferenças na diversidade bacteriana, mas não na riqueza, com maior abundância relativa de Bacteroides spp. e Rickenellaceae spp. A abundância relativa de Erysipelotrichacaea spp. foi menor.
> Insuficiência cardíaca
Pacientes com insuficiência cardíaca (IC), desnutrição e caquexia frequentemente desenvolvem uma resposta inflamatória e imune sistêmica. Acredita-se que essa condição seja causada por disfunção intestinal, que permite a translocação bacteriana e a entrada de microrganismos e endotoxinas na circulação. Estudos demonstraram que pacientes com IC apresentam flora intestinal mais disfuncional que indivíduos saudáveis.
Evidências crescentes apoiaram a correlação entre IC e microbiota intestinal. Em pacientes com insuficiência cardíaca, as concentrações expiradas de hidrogênio estão associadas à gravidade da doença e a um risco maior de desfechos adversos. Estudos recentes demonstraram uma relação bidirecional entre a flora intestinal e o cérebro, ocorrendo por meio de vias neurais, hormonais e imunológicas, denominada eixo intestino-cérebro.
> Trombose Venosa Profunda (TVP)
A trombose venosa profunda (TVP) também pode estar associada ao SIBO. Devido aos níveis aumentados de fatores inflamatórios e à expressão de TLR-4—que, ao se combinar com lipopolissacarídeos, intensifica a atividade pró-coagulante—, o SIBO é considerado um fator de risco para TVP. A tempestade de citocinas na TVP pode estimular a imunidade intestinal ao afetar sua microflora, sendo, assim, um fator de risco para o supercrescimento.
> Aterosclerose Subclínica
Os produtos metabólicos gerados por bactérias intestinais têm sido implicados no desenvolvimento de lesões ateroscleróticas subclínicas. A população humana depende das bactérias intestinais para suprir sua necessidade de vitamina K2, especialmente em dietas ocidentais. O SIBO está associado a uma disfunção no metabolismo da vitamina K em humanos. Portanto, o supercrescimento, o status reduzido de vitamina K2, ou ambos, podem, hipoteticamente, aumentar o risco de desenvolvimento de doença aterosclerótica. Um estudo realizado em 2022 confirmou que o SIBO está associado à presença de placas ateromatosas subclínicas. Essas foram mais comuns no grupo com supercrescimento bacteriano, e o mecanismo dessa associação merece exploração adicional.
> Diabetes
A incidência de supercrescimento bacteriano do intestino delgado (SIBO) é significativamente maior em pacientes com diabetes tipo I e tipo II em comparação com a população saudável. A patogênese do supercrescimento bacteriano da doença ainda não é totalmente compreendida, mas sabe-se que envolve fatores multifatoriais, como hiperglicemia, esvaziamento gástrico retardado e motilidade intestinal prejudicada devido à neuropatia autonômica diabética.
Além dos tipos I e II, o SIBO também está associado ao diabetes mellitus gestacional (DMG). Em um estudo com mulheres chinesas grávidas com DMG, sintomas como distensão abdominal e dor foram relacionados a concentrações mais altas de hidrogênio e metano exalados, em comparação com o grupo controle. Além disso, a glicemia e o peso ao nascimento dos bebês foram maiores em mulheres com SIBO. O tratamento com prebióticos, probióticos e antibióticos reduz os sintomas gastrointestinais em pacientes diabéticos.
> Hiperlipidemia
O SIBO pode causar hiperlipidemia por meio da perturbação da circulação entero-hepática, que resulta da desconjugação precoce dos ácidos biliares e da produção subsequente de endotoxinas e estresse oxidativo no fígado, levando à hiperprodução de colesterol e lipoproteínas aterogênicas. O SIBO esteve presente em 78,9% dos pacientes com hiperlipidemia e em 40% dos controles, sendo observadas relações entre o nível de hidrogênio exalado e os níveis de lipoproteínas de baixa densidade, triacilgliceróis e lipoproteínas de densidade muito baixa.
> Obesidade
Fatores como o ambiente, dieta, falta de sono, desequilíbrio hormonal e inflamação crônica contribuem para a obesidade, mas a microbiota humano desempenha um papel importante. Estudos em camundongos demonstraram uma maior quantidade de bactérias do gênero Firmicutes e uma menor de Bacteroidetes nos obesos. Análises genéticas revelaram que esses últimos estão relacionados a uma maior extração de energia dos alimentos.
Apesar de resultados inconsistentes, a obesidade está associada a um risco aumentado de SIBO. Diversos mecanismos influenciam a ocorrência do aumento do IMC, sendo o primeiro deles a absorção mais eficiente de energia dos alimentos pela microflora intestinal. Estudos mostram níveis elevados de ácidos graxos de cadeia curta (AGCC)—compostos energéticos derivados da digestão de carboidratos no intestino grosso—em pessoas obesas, o que resulta em maior lipogênese hepática e formação de tecido adiposo. Outro fator é a alteração da motilidade intestinal, com trânsito mais lento e maior absorção na parte proximal do intestino, levando ao ganho de peso. A alteração da flora intestinal e o esvaziamento gástrico acelerado também são fatores relacionados à obesidade. Além disso, a dieta ocidental, rica em gorduras e carboidratos, reduz os níveis de microrganismos benéficos no intestino.
> Doença da tireoide
Os distúrbios endócrinos são frequentemente acompanhados por sintomas gastrointestinais, como constipação, diarreia ou desconforto abdominal. Apesar de haver poucos dados e de sua patogênese não estar completamente explicada, parece que o hipotireoidismo pode retardar a motilidade intestinal, e mais de 50% dos pacientes a doença também sofrem de SIBO. Curiosamente, foi observado que a suplementação com levotiroxina interfere fortemente no supercrescimento. Os antígenos bacterianos podem induzir tanto a doença de Hashimoto quanto a de Graves-Basedow, ambas de base autoimune. Um estado de disbiose intestinal modifica a resposta imunológica, induzindo inflamação, o que, por sua vez, aumenta a sensibilidade da parede intestinal e, consequentemente, a sua permeabilidade, provocando uma reação do sistema imunológico podem desempenhar um papel essencial no desenvolvimento dessas doenças. Bons hábitos alimentares e o consumo de quantidades adequadas de ácidos graxos ômega-3, fibras e produtos vegetais desempenham um papel significativo na melhoria do microbioma intestinal, o que pode reduzir a inflamação.
> Lesão renal
A maioria dos pacientes com doença renal crônica apresenta sintomas gastrointestinais. A insuficiência renal, por sua vez, resulta em uma predisposição a alterações na microbiota, associadas ao supercrescimento de bactérias aeróbicas e proteolíticas no duodeno e jejuno. Além disso, foram observadas alterações na estrutura da parede intestinal, incluindo a degradação das vilosidades intestinais, aumento das criptas, disrupção da integridade das células epiteliais, infiltração de células inflamatórias na lâmina própria e comprometimento da excreção de metabólitos bacterianos (como sulfato de indoxil e p-cresol) na urina, promovendo, assim, desordens intestinais.
Uma incidência significativamente maior de SIBO foi observada em pacientes com doença renal crônica em comparação com controles. As toxinas urêmicas—cujos precursores são aminoácidos (como triptofano, fenilalanina e tirosina), produzidos durante o metabolismo bacteriano e convertidos no fígado em toxinas urêmicas (sulfato de indoxil e sulfato de p-cresol), que são removidas sob condições fisiológicas pelos rins junto com a urina—parecem ser responsáveis por esse mecanismo. Sua acumulação em pacientes com insuficiência renal crônica afeta o sistema nervoso autônomo do trato gastrointestinal, piorando a motilidade intestinal e promovendo o crescimento bacteriano excessivo. Por outro lado, o aumento da permeabilidade intestinal em pacientes com DRC permite que antígenos entrem na corrente sanguínea. Então, as toxinas bacterianas podem ser capturadas pelos transportadores aniônicos nos túbulos renais, comprometendo sua função.
Durante a lesão renal aguda (LRA), também pode ser observada disbiose intestinal. Em relação ao seu principal fator desencadeante—lesão por isquemia-reperfusão (IRI)—seu mecanismo patogenético complexo está potencialmente relacionado à formação de espécies reativas de oxigênio que danificam as células endoteliais. A liberação de mediadores inflamatórios e a expressão de moléculas de adesão são, portanto, iniciadas durante a isquemia e a subsequente reperfusão, o que pode induzir disbiose intestinal e, por sua vez, exacerbar a inflamação, agravando o dano renal.
> Rosácea
Pacientes com rosácea apresentaram uma exposição ao SIBO até 13 vezes maior em comparação com controles, e a regressão das lesões cutâneas foi observada após o tratamento do supercrescimento com rifaximina. O mecanismo para a coexistência de SIBO e rosácea ainda não foi completamente elucidado, mas suspeita-se que as bactérias aumentem a permeabilidade intestinal, resultando na transferência dessas e de citocinas pró-inflamatórias para a circulação sistêmica, causando inflamação cutânea.
> Psoríase
A psoríase pode envolver diferentes partes do corpo, como a cavidade oral, onde se manifesta como a chamada língua geográfica. Trata-se de uma inflamação benigna da língua que "muda" de posição em sua superfície, aparecendo como lesões vermelhas em formato oval, cercadas por uma borda branca. A literatura descreveu um caso de uma mulher com psoríase lingual sem lesões cutâneas psoriáticas. A paciente experimentava dor, sensação de queimação na língua e dificuldade para comer. Além disso, foi diagnosticada com SIBO, e após a administração de rifaximina, observou-se uma melhora significativa na condição da língua, eliminando a dor e o desconforto. Após três meses, não houve recorrência das lesões psoriáticas na cavidade oral. A combinação de rifaximina com um prebiótico, que pode beneficiar a motilidade intestinal, parece ser mais útil na erradicação do SIBO do que o antibiótico isolado.
> Doença de Alzheimer
A patogênese da doença de Alzheimer (DA) não é bem definida e é, provavelmente, multifatorial, muitas vezes mostrando ligações significativas com outras doenças, como depressão, diabetes, doenças cardiovasculares e doenças inflamatórias intestinais (DII). A microbiota intestinal regula o sistema imunológico e o nervoso central, afetando a produção adequada de moléculas neuroativas (por exemplo, serotonina, acetilcolina, triptofano, histamina, GABA e catecolaminas). Os mecanismos exatos das comorbidades gastrointestinais com a DA ainda não são conhecidos. No entanto, estudos sugeriram que uma estrutura anormal da microbiota intestinal resulta na produção de metabólitos tóxicos que penetram na corrente sanguínea e chegam ao cérebro, causando inflamação no sistema nervoso. As fezes de pacientes com DA mostraram um microbioma menos diverso e níveis menos variados de calprotectina em comparação ao grupo controle.
> Doença de Parkinson
A doença de Parkinson (DP) é caracterizada por alterações neuropatológicas, como o acúmulo anormal de α-sinucleína e a necrose dos neurônios dopaminérgicos na substância negra. Além dos sintomas típicos, como tremores e rigidez dos membros, os pacientes também apresentam distúrbios gastrointestinais decorrentes da motilidade anormal e do esvaziamento gástrico retardado. A coinfecção por H. pylori exacerba sinergicamente esses sintomas gastrointestinais. Diversos estudos confirmaram a associação entre supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SIBO) e a DP, com taxas da doença gástrica variando entre 14% e 67%. O SIBO foi associado a piores sintomas gastrointestinais e pior função motora. O aumento da permeabilidade intestinal expõe a mucosa a exotoxinas bacterianas e LPS, fatores responsáveis pela inflamação local, que podem aumentar a amiloidogênese de α-sinucleína e a suscetibilidade neuronal à neurodegeneração. O SIBO também afeta a absorção de medicamentos entéricos usados no tratamento da DP; a disfunção intestinal decorrente de alterações na microflora resulta em absorção prejudicada da levodopa, o que leva à redução das concentrações de dopamina no cérebro. O excesso de bactérias no intestino pode induzir a produção de espécies reativas de oxigênio, que inativam o medicamento e alteram sua biodisponibilidade.
> Transtornos do espectro autista
Os transtornos do espectro autista (TEAs) estão sendo diagnosticados com maior frequência, embora sua patogênese ainda seja desconhecida. Vários estudos em pacientes com diferentes graus da doença (leve a grave) mostraram modificações significativas na composição da microbiota intestinal. Níveis mais elevados de Bacteroides ou Clostridium perfringens foram observados na população autista, enquanto níveis mais altos de Firmicutes foram encontrados na saudável. Ademais, estudos mostraram que crianças com autismo apresentavam uma incidência de SIBO de 31,0%, o que foi maior em comparação aos controles.
> Transtornos mentais
A disbiose e a inflamação do intestino estão ligadas a vários problemas de saúde mental, incluindo ansiedade e depressão, em crianças e adultos. Em um estudo realizado com pacientes com SIBO, esses expressavam específicos de traços de personalidade, incluindo maior neuroticismo, menor extroversão e um maior estado de ansiedade e estresse. Estudos experimentais indicaram que o estresse psicológico pode afetar negativamente o tempo de trânsito do intestino delgado, promover a síndrome de SIBO e desregular significativamente o equilíbrio da barreira intestinal. A ativação crônica do eixo hipotalâmico–hipofisário–adrenal pode desempenhar um papel crucial no desenvolvimento do SIBO, pois a resposta ao estresse está intimamente ligada à microbiota do intestino. Muitos pesquisadores têm se concentrado na análise e avaliação do estado mental e das queixas gastrointestinais de pacientes com SIBO em relação ao metabolismo do triptofano e ao tratamento com rifaximina. O SBO altera o metabolismo do triptofano, o que pode causar distúrbios abdominais e de humor. Ansiedade leve e moderada, bem como depressão leve, foram diagnosticadas em todos os pacientes com SIBO. O tratamento com rifaximina melhorou seus distúrbios de humor e problemas gastrointestinais, enfatizados por mudanças no metabolismo do triptofano. Outros estudos mostraram que o SIBO ocorre em pacientes com depressão e diabetes, com a incidência sendo duas vezes maior do que na população geral.
> Fibrose cística (FC)
A literatura científica relatou uma alta prevalência de SIBO em pacientes com fibrose cística (FC). Com base em estudos em animais, observou-se que a incidência do supercrescimento na condição varia de 31% a 56%. A explicação parece ser uma mutação no gene CFTR, levando ao aumento da secreção de muco intestinal condensado anormal, com danos às células de Paneth, o que reduz ainda mais a motilidade do intestino delgado.
> Febre mediterrânea familiar
A febre mediterrânea familiar (FMF) é uma doença genética (devido a uma mutação no gene MEFV) que causa febres recorrentes e inflamação dolorosa do abdômen, tórax e articulações. A colchicina é um alcaloide lipossolúvel que se liga à β-tubulina, inibindo a quimiotaxia de neutrófilos e reduzindo a expressão de moléculas de adesão. Ela previne ataques febris e é usada para controlar a inflamação no contexto da FMF; no entanto, de 5% a 10% dos pacientes com a condição não respondem ao tratamento. Isso está provavelmente relacionado a vasculite, doença inflamatória intestinal ou infecções ocultas, que são fatores que reduzem a eficácia dos medicamentos. Foi demonstrado que o SIBO afeta a resposta à colchicina e a gravidade clínica dos pacientes. Pode-se supor que produtos bacterianos intestinais alterados da microbiota intestinal podem agir em pacientes com hipersensibilidade da imunidade inata, como FMF ou doença de Crohn, acentuando as manifestações clínicas das doenças autoinflamatórias.
> Câncer gastrointestinal
Até o momento, as associações entre SIBO e câncer pancreático, colangiocarcinoma, câncer gástrico e colorretal (CCR), esofagogástrico (CEG) e carcinoma hepatocelular (CHC) foram consideradas nos pacientes com tais doenças. Em um estudo, o SIBO foi associado a câncer gastrointestinal. Esse concluiu que a intervenção probiótica combate o SIBO e alivia os sintomas gastrointestinais. Outro estudo observou que pacientes com CCR pós-operatório têm maior probabilidade de desenvolver SIBO. A rifaximina melhorou os sintomas gastrointestinais gerais, particularmente a diarreia, em pacientes SIBO. A expressão da proteína TLR4 em pacientes com carcinoma pancreático e colangiocarcinoma foi significativamente maior em pacientes SIBO. Estudos mostraram que os níveis de expressão de TLR2 e TLR4 e a incidência de SIBO em pacientes com CHC eram significativamente mais altos do que nos grupos de cirrose e controle saudável.
Conclusão |
A conscientização e o conhecimento sobre SIBO, como uma doença relativamente nova, podem mudar a vida das pessoas afetadas por esse problema. Até agora, a pesquisa sobre as relações entre SIBO e outras doenças concentrou-se principalmente em distúrbios gastrointestinais, incluindo síndrome do intestino irritável, doença de Crohn, colite ulcerativa, doença celíaca, doença hepática gordurosa não alcoólica, cirrose hepática e pancreatite. No entanto, ao longo dos anos, foi demonstrado que um número crescente de evidências destaca a associação do SIBO com outros grupos de doenças, incluindo distúrbios autoimunes, doenças do sistema cardiovascular, metabólicas, endócrinas, nefrológicas, dermatológicas, neurológicas, de desenvolvimento e mentais, bem como doenças genéticas e cânceres gastrointestinais.
O SIBO é um fator de risco em muitos grupos de doenças, complicando o curso dessas condições e potencialmente desempenhando um papel patogenético no desenvolvimento de seus sintomas. O conhecimento sobre as associações entre o SIBO e vários grupos de doenças pode ajudar a proporcionar diagnósticos melhores e permitir a iniciação oportuna de tratamentos ou co-tratamentos eficazes.