O cigarro eletrônico foi originalmente introduzido no mercado como uma alternativa menos prejudicial aos cigarros convencionais e como uma opção terapêutica para combater o tabagismo. No entanto, este dispositivo pode conter substâncias nocivas e potencialmente prejudiciais à saúde, como nicotina, diacetil (uma substância química associada a uma doença pulmonar grave), compostos orgânicos voláteis, produtos químicos cancerígenos e metais pesados (como níquel, estanho e chumbo).
Estudos têm sugerido que o uso crônico e agudo dos cigarros eletrônicos, também conhecidos como vapes, está diretamente relacionado ao desenvolvimento de várias doenças respiratórias, gastrointestinais, orais, entre outras, além de causar dependência.
Consequências cardiovasculares |
Alguns estudos destacaram que a exposição aos vapores dos cigarros eletrônicos poderia resultar em um aumento transitório na frequência cardíaca e na pressão arterial, indicando uma resposta cardiovascular aguda à inalação dos componentes químicos. Além disso, foram apontados os possíveis efeitos adversos dos compostos químicos presentes no líquido dos cigarros eletrônicos, como propilenoglicol e glicerina vegetal, que podem desencadear processos inflamatórios e estresse oxidativo no sistema cardiovascular, contribuindo para o desenvolvimento de aterosclerose.
A nicotina, presente na composição do líquido usados nos cigarros eletônicos, possui efeito vasoconstritor e viciante, levando ao aumento no risco de infarto agudo do miocárdio e insuficiência cardíaca.
Consequências respiratórias |
Um estudo apoiado pela Fapesp analisou células da mucosa bucal de mais de 90 participantes, incluindo fumantes de cigarro convencional, fumantes de cigarro eletrônico, ex-fumantes e não fumantes. Os exames detectaram alterações significativas nas células dos dois primeiros grupos. Os líquidos, conhecidos como juices, presentes nos cigarros eletrônicos são um ponto de especial atenção dos especialistas. Muitos desses apresentaram uma elevada concentração de nicotina, conforme mencionado em um relatório da Anvisa. Além disso, foram associados ao desenvolvimento da pneumonia lipoide endógena e a detecção de macrófagos carregados de lipídeos.
Além disso, o uso do dispositivo contribuiu para alterações fisiopatológicas, irritabilidade ao epitélio, inflamação das vias aéreas e pulmonares, além de efeitos fisiológicos imediatos negativos como aumento da resistência do fluxo de ar. Atualmente, estudos evidenciaram uma relação do uso desse dispositivo com uma nova doença denominada de Lesão Pulmonar Aguda E-Vaping (EVALI), a qual os sintomas incluem tosse, falta de ar, hemoptise, febre, mal-estar e, ainda, sintomas gastrointestinais como a presença de náuseas, vômitos e dor abdominal.
O cigarro eletrônico pode levar a exarcebações de asma com ataques mais frequentes, graves e maior dificuldade do controle da doença. A ativação inflamatória também está relacionada com casos de lesões pulmonares agudas, ocasionando o dano alveolar difuso e pneumonia. Em um estudo realizado por Chaffee et al., (2021), o uso do cigarro eletrônico por mais de 5 dias ao mês foi relacionado aos sintomas de bronquite e falta de ar. Além disso, demonstraram que as chances de sintomas brônquicos aumentaram em mais de 1,5 vezes com o uso desse dispositivo.
Por fim, o uso desses dispositivos foi relacionado a um maior número de diagnósticos e exarcebações da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), além disso houve maior probabilidade de avanço da doença nos testes de função pulmonar.
Consequências no trato gastrointestinal |
A nicotina foi relacionada com diversas doenças orais, como lesões da mucosa oral, lacerações, avulsões dentárias, estomatite nicotínica, língua negra pilosa e xerostomia. Mesmo quando não há a substância no líquido, efeitos adversos à saúde bucal foram relatados. As bactérias orais, quando expostas a altas concentrações de aromatizante, têm seu crescimento reduzindo, sendo assim, há a disbiose.
O uso de cigarros eletrônicos desencadeou processos inflamatórios no trato gastrointestinal e modulou a microbiota intestinal, alterando o equilíbrio e a diversidade microbiana, tornando o revestimento intestinal mais suscetível à infecções. Além disso, estudos indicaram que essas interferiram na motilidade do trato gastrointestinal, podendo causar diarreias e vômitos.
O uso no Brasil |
No Brasil, os dispositivos de cigarro eletrônico, apesar da sua comercialização, importação e propaganda, são proibidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde 2009. A autarquia acusa esses produtos de serem ineficientes para o tratamento do tabagismo, de atuarem como porta de entrada dos jovens ao vício e de proporcionarem aos usuários uma percepção incorreta dos riscos em que estão se inserindo, uma vez que não se enxergam como fumantes e se sentem atraídos pelos aditivos adocicados. A Anvisa discutirá hoje (19 de abril) sobre o debate sobre a regulamentação de cigarros eletrônicos no Brasil.
Referências
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