Introdução |
A osteoartrite (OA) é uma das doenças mais comuns entre os idosos, e sua principal causa é o desgaste da cartilagem ao longo do tempo. Isso causa impacto significativo na qualidade de vida, com sintomas como dor, rigidez, inchaço, sensibilidade e limitação de movimento articular. Até o momento, não existe uma cura definitiva, mas há tratamentos que buscam aliviar os sintomas e melhorar a função das articulações, como exercícios, controle de peso, fisioterapia, medicamentos e, em alguns casos, cirurgia.
Com uma compreensão mais aprofundada da fisiopatologia da doença, descobriu-se que a OA afeta toda a articulação, não apenas a cartilagem. Medicamentos que modificam a progressão da enfermidade têm se mostrado promissores, regulando processos como o anabolismo/catabolismo da cartilagem, a remodelação do osso abaixo da mesma ou a inflamação na membrana sinovial. Um artigo conduzido por Zhang e colaboradores (2019) abrangeu a medicina tradicional e explorou os medicamentos emergentes com fármacos modificadores da doença que se mostraram promissores em estudo clínicos e pré-clínicos.
1 | Medicamentos tradicionais |
Foram sido extensivamente documentados na literatura e são frequentemente utilizados no manejo clínico atual da doença.
> Paracetamol
O paracetamol é um analgésico de venda livre frequentemente indicado como tratamento inicial para pessoas que sofrem de osteoartrite leve a moderada. Sua ação inibe de forma significativa a COX-3, reduzindo tanto a dor quanto a febre. Estudos que compararam a substância com placebos em sete ensaios clínicos randomizados (ECR) demonstraram que o paracetamol foi mais eficaz na redução geral da dor, com resultados estatisticamente significativos (p < 0,05).
Apesar de ser a terapia preferencial para a osteoartrite, há relatos de que o consumo excessivo pode resultar em danos ou insuficiência hepática. Segundo as diretrizes da AAOS, a dosagem máxima recomendada para um tratamento inicial eficaz da OA leve a moderada no joelho ou quadril é de 3.000 mg por dia. Essa quantidade visa mitigar o risco de lesões no fígado.
> AINEs
Os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) são frequentemente utilizados para tratar pacientes com osteoartrite. Essa classe atua suprimindo a atividade das enzimas ciclooxigenase, resultando na inibição das COX-1 e COX-2, e oferece efeitos analgésicos, antipiréticos e anti-inflamatórios. A sua eficácia é amplamente respaldada, mostrando melhorias gerais em relação ao paracetamol no alívio da dor.
Entretanto, seu uso é restrito a curto prazo devido ao elevado risco de efeitos colaterais, sendo as complicações gastrointestinais as mais comuns. Portanto, a relação entre benefícios e riscos tornou-se um fator crucial na prescrição de AINEs, recomendando-se a utilização da menor dose eficaz possível e o seu uso por períodos limitados.
> Analgésicos opioides
Os analgésicos opioides são prescritos para gerenciar a dor quando as terapias convencionais não são eficazes ou contraindicadas. Esses medicamentos atuam inibindo a via da dor no sistema nervoso central, ligando-se aos receptores opioides mu. Entretanto, eles apresentam um risco considerável de efeitos adversos, como náuseas, vômitos, tonturas, sonolência, fadiga e dores de cabeça. Além disso, há uma preocupação significativa com o risco de overdose ou desenvolvimento de dependência.
Por conta desses fatores, o seu uso prolongado não é recomendado devido ao risco de overdose e ao perigo de dependência. Eles são reservados para situações específicas em que outras opções não conseguem controlar a dor de maneira eficaz.
> Inibidores seletivos de recaptação de serotonina-norepinefrina (IRSNs)
Os IRSNs são utilizados principalmente no tratamento da depressão e outros distúrbios de humor, agindo para inibir a reabsorção de serotonina e norepinefrina. A duloxetina, por exemplo, foi aprovada pelo FDA para o manejo clínico da dor crônica musculoesquelética, incluindo a associada à OA.
Em dois ensaios clínicos duplo-cegos, comparados a placebos, a duloxetina revelou melhorias significativas na redução da dor e na melhora da função física. Entre os efeitos colaterais mais comuns associados aos IRSNs estão problemas gastrointestinais, disfunção sexual, fadiga e sonolência.
> Injeções intra-articulares de corticosteroides
As injeções intra-articulares (IA) de corticosteroides são recomendadas para pacientes que enfrentam dor moderada a intensa e não tiveram resposta satisfatória aos tratamentos iniciais. Possuem um efeito anti-inflamatório e imunossupressor imediato e marcante. Atuam diretamente nos receptores nucleares de esteroides, interrompendo a cascata inflamatória e imunológica. Isso resulta na regulação negativa da expressão de proteínas pró-inflamatórias e na redução das citocinas inflamatórias.
Entretanto, os benefícios das injeções IA de corticosteroides ainda não são completamente claros e demandam mais investigações.
2 | Medicamentos emergentes |
Devido à limitação dos medicamentos tradicionais para OA, alguns fármacos emergentes modificadores da doença mostraram-se promissores na modificação da progressão da doença, regulando o anabolismo/catabolismo da cartilagem, a remodelação óssea subcondral ou a inflamação sinovial.
> Proteína Morfogenética Óssea-7 (BMP-7)
O BMP-7, pertencente à superfamília do fator de crescimento transformador (TGF)-β, foi aprovado pela FDA como um produto biológico para o tratamento da não união óssea e fusão espinhal. Desempenhando papéis essenciais na embriogênese, homeostase e regeneração óssea e cartilaginosa, apresenta efeitos anabólicos na cartilagem articular. Estimula a síntese de componentes específicos da matriz extracelular, como colágeno tipo II e agrecano, sem provocar a hipertrofia de condrócitos ou a produção de proteínas associadas ao osso.
Embora a BMP-7 tenha sido objeto de investigação ao longo de várias décadas em pesquisas, é necessário conduzir mais ensaios clínicos para determinar sua viabilidade como tratamento clínico para a osteoartrite.
> Fator de crescimento de fibroblastos-18 (FGF-18)
O FGF-18 desempenha um papel fundamental na formação e reparo da cartilagem. Em experimentos de cultura de células de condrócitos, a esprifermina (FGF-18 recombinante humano) demonstrou promover a proliferação celular, preservando o fenótipo dos condrócitos e aumentando positivamente a expressão de marcadores típicos dessas células.
Uma análise de três anos do estudo FORWARD, fase II, revelou um aumento significativo na espessura da cartilagem na articulação femorotibial em pacientes tratados com esprifermina 100 μg em comparação com o placebo. O fármaco mostrou ser eficaz na melhora da espessura da cartilagem em casos de osteoartrite no joelho, mantendo um perfil de segurança aceitável. No entanto, são necessários mais estudos para uma compreensão mais aprofundada de seu potencial e aplicação clínica futura.
> Albumina de soro humano (HSA)
Foi relatado que a fração de baixo peso molecular de 5% de HSA (LMWF-5A) produz efeitos anti-inflamatórios, induzindo alterações transcricionais de células-tronco mesenquimais e aumentando COX-2, prostaglandina E2 e D2 na inflamação e regulando positivamente a transcrição de colágeno 2α1 durante a diferenciação condrogênica, sendo assim eficaz no tratamento da OA.
O Ampion™, LMWF-5A (<5 kDa) desenvolvido pela Ampio Pharmaceuticals, exibiu em estudos propriedades anti-inflamatórias ao inibir a produção de citocinas pró-inflamatórias em células T. Até o momento, não foram registradas mortes graves relacionadas ao medicamento ou sintomas de abstinência associados a eventos adversos durante o tratamento. São necessários ensaios clínicos de longo prazo adicionais para uma compreensão mais aprofundada de seus benefícios clínicos.
> Anticorpo do fator de crescimento do nervo β (β-NGF)
Anticorpos monoclonais são uma nova abordagem terapêutica para diversas doenças ósseas, incluindo a OA. O Tanezumab, um anticorpo experimental contra β-NGF, visa tratar a dor crônica em pacientes com essa condição. Estudos identificaram o potencial da substância na influência da dor, sensibilizando os nociceptores. Níveis elevados de NGF foram encontrados no líquido sinovial de pacientes com OA.
Em um ensaio clínico com 450 pacientes com OA no joelho, o Tanezumab demonstrou uma significativa redução da dor e uma melhoria global (p < 0,001) em comparação com o placebo. Porém, o tratamento apresentou uma alta taxa de eventos adversos, como dor de cabeça, infecção respiratória e parestesia, em comparação ao placebo (68% vs. 55%). Em alguns casos, houve progressão da OA, exigindo substituições articulares totais.
Estudos posteriores sugeriram que o risco de progressão rápida da OA era maior quando o Tanezumab era combinado com AINEs do que quando usados isoladamente. Em 2017, o fármaco recebeu a designação Fast Track da FDA para tratamento da OA, indicando um processo de aprovação potencialmente mais ágil.
> Inibidor da interleucina-1 (IL-1)
A IL-1 desempenha um papel crucial na progressão da osteoartrite, estimulando a produção de enzimas proteolíticas, citocinas e outros mediadores que promovem a inflamação e a deterioração dos tecidos, contribuindo para a degradação da matriz extracelular da cartilagem. Estudos em animais indicaram que a inibição da produção ou atividade da IL-1 pode impedir o desenvolvimento da osteoartrite experimentalmente induzida.
Em relação aos pacientes com OA, o uso de um inibidor do receptor de IL-1 foi investigado em dois ensaios clínicos, mas não mostrou melhora clínica significativa em comparação com o controle. Isso apontou para a necessidade de uma investigação mais detalhada no futuro para compreender melhor seu potencial terapêutico.
> Fosfoglicoproteína extracelular de matriz (MEPE)
A MEPE é uma proteína reguladora de minerais que é expressa principalmente em osteócitos e odontoblastos. Existe a possibilidade de que regule negativamente a mineralização e, portanto, apresente potencial para o tratamento da osteoartrite. O TPX-100, um novo peptídeo derivado de MEPE, foi utilizado para tratar pacientes com OA. Não foram registrados eventos graves nos estudos realizados, porém é crucial conduzir novas pesquisas para validar a sua segurança e eficácia.
> Hormônio da paratireoide (PTH) / Proteína relacionada ao hormônio da paratireoide (PTHrP)
Foi observado que o PTH ou sua forma similar, o PTHrP, possuem a capacidade de impedir a hipertrofia dos condrócitos e controlar o processo de ossificação endocondral na placa de crescimento, atuando por meio do eixo regulador Ihh-PTHrP. Além disso, foi identificado que esses componentes regulam a remodelação óssea subcondral e diminuem a diferenciação final da cartilagem articular.
A teriparatida, uma forma recombinante do PTH humano, demonstrou eficácia na redução da degradação da cartilagem e na prevenção da anormal diferenciação dos condrócitos em um modelo de osteoartrite induzida por lesão em camundongos.
> Inibidor de TGF- β
O TGF-β é essencial para a manutenção da saúde metabólica e da estrutura da cartilagem articular. Seus níveis elevados foram observados no osso subcondral em modelos cirúrgicos de osteoartrite em camundongos e em pacientes humanos com essa condição. O aumento do TGF-β1 ativo contribuiu para a formação anormal de células-tronco mesenquimais (MSC) positivas para nestina, resultando em anormalidades ósseas subcondrais e maior angiogênese.
Nos estudos em camundongos com osteoartrite experimental, a inibição do receptor TGF-β tipo II (TβRII) em MSCs positivas para nestina impediu o desenvolvimento da OA. Além disso, a inibição da sinalização do TGF-β1 por meio da administração de um inibidor do receptor TGF-β tipo I (SB-505124) ou do implante de um anticorpo para TGF-β (1D11) no osso subcondral protegeu contra a degeneração da doença. Esses resultados indicaram que a inibição do TGF-β pode ser um potencial alvo para o desenvolvimento futuro de medicamentos no tratamento da osteoartrite.
> Metabolismo do colesterol e agonista inverso do receptor alfa órfão relacionado ao ácido retinóico (RORα)
A interação entre o metabolismo do colesterol e o ROR desempenha um papel crucial na patogênese da OA, e o eixo específico CH25H-CYP7B1-RORα está especialmente relacionado à cartilagem. O RORα é um alvo a jusante do eixo do metabolismo do colesterol CH25H-CYP7B1, que pode ser ativado pelo colesterol e seu metabólito oxisterol, regulando positivamente a expressão de MMP3, MMP13 e ADAMTS5, causando destruição da cartilagem da OA.
Em estudos, a injeção intra-articular de SR3335, um agonista inverso do RORα, mostrou uma significativa redução na degradação da cartilagem causada pela superexpressão de RORα ou por cirurgia de menisco medial mediada por adenovírus. Além disso, esse tratamento inibiu a regulação positiva de MMP3 e MMP13 induzida pelo colesterol e seus metabólitos. Portanto, as interações entre o metabolismo do colesterol e o RORα representaram potenciais alvos terapêuticos promissores para o tratamento da osteoartrite.
Conclusão |