Congresso Brasileiro de Cardiologia

Diretrizes recentes que foram destaques no 78 Congresso Brasileiro de Cardiologia

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Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia sobre Diagnóstico e Tratamento de Pacientes com Cardiomiopatia da Doença de Chagas – 2023

A doença de Chagas (DC) é entidade mórbida transmissível, potencialmente fatal, causada pelo protozoário parasita T. cruzi e que integra o grupo de doenças tropicais negligenciadas (DTN) da Organização Mundial da Saúde (OMS).

No Brasil, as estimativas mais recentes indicaram que em 2010 teriam 1.156.821 pessoas infectadas pelo T. cruzi (0,6%). Entretanto, a limitação de estudos de base populacional dificulta avaliações mais realistas da magnitude da DC no país.

T. cruzi é parasito hemoflagelado, transmitido principalmente pelo contato com dejetos de diferentes espécies da ordem Hemiptera, família Reduviidae, subfamília Triatominae, cujo habitat se estende da Argentina e Chile até a metade sul dos Estados Unidos da América, contaminadas ao sugarem o sangue de pessoas ou animais infectados. Além disso, a transmissão pode ocorrer por: 1- ingestão de alimentos ou bebidas contaminados com triatomíneos ou seus dejetos; 2- via transplacentária; 3- transfusão de sangue ou hemocomponentes; 4- transplantes de órgãos sólidos a partir de doadores infectados; e 5- acidentes com materiais biológicos.

A DC é multissistêmica e sua história natural é caracterizada por uma fase aguda, que pode durar até algumas semanas ou meses, geralmente com expressão clínica leve ou assintomática, e uma fase crônica. Estima-se que 30-40% das pessoas infectadas não tratadas desenvolvem síndromes clínicas graves na fase crônica, às vezes fatais, ao longo de suas vidas. Essas lesões estão associadas a acometimento de órgãos-alvo, levando a manifestações cardíacas, digestivas, neurológicas ou mistas, que podem exigir tratamento etiológico.

A cardiomiopatia crônica da doença de Chagas (CCDC) pode ser desenvolvida em cerca de 30% a 50% dos pacientes com a DC. Ela não é só a mais frequente das manifestações, mas como também a mais grave, com grau de morbidade atingindo níveis de 30%. Pode se manifestar de diversas formas, dependendo basicamente da gravidade das alterações do miocárdio e do sistema específico de geração e condução elétrica, da presença e do tipo de arritmia e da existência de insuficiência cardíaca. No quadro abaixo são listadas as alterações que em geral definem a presença de CCDC e aquelas que, isoladamente, não são suficientes para firmar esse diagnóstico, sendo consideradas “não definidoras”.

Quadro 1: Alterações eletrocardiográficas definidoras da cardiomiopatia crônica da doença de Chagas. Imagem retirada de Marin-Neto e colaboradores (2023).

O diagnóstico da doença infecciosa deve ser apoiado por dados clínicos, epidemiológicos e laboratoriais. Esses três elementos devem ser considerados para confirmar o diagnóstico ou excluí-lo.

Alguns dados clínicos podem ser considerados muito sugestivos de cardiomiopatia crônica da doença de Chagas, como o bloqueio de ramo direito no ECG. Mas nenhuma anormalidade eletrocardiográfica é específica da condição, tampouco ocorre em todos os pacientes com a doença. Os dados epidemiológicos, em particular a procedência do paciente de áreas reconhecidamente endêmicas, também auxiliam no diagnóstico. Assim, outro dado que deve ser valorizado relaciona-se aos antecedentes familiares, presentes em dois terços dos pacientes de área endêmica, em particular mãe ou irmãos infectados ou com história de morte súbita.

O laboratório pode detectar o parasito ou, mais comumente, os anticorpos anti-T. cruzi. Na fase crônica da DC a maioria dos pacientes apresenta baixa parasitemia e os parasitos não são encontrados no exame de sangue. Sendo assim, o médico que deseja confirmar ou excluir a etiologia tripanossomótica cruzi em paciente com cardiopatia deve solicitar, inicialmente, os exames sorológicos.

Assegurar acesso a tratamento etiológico antiparasitário (tripanocida) eficaz, eficiente e seguro para a infecção por T. cruzi persiste como um desafio crítico ao se analisarem os avanços ao longo dos últimos 50 anos. Em muitos cenários locorregionais, métodos para diagnóstico complementar e medicamentos para tratamento não estão disponíveis e as populações locais não estão suficientemente informadas de sua factibilidade.

Nessas últimas cinco décadas, ainda se registra gritante limitação de opções para tratamento etiológico, havendo disponibilidade apenas de dois medicamentos comprovadamente eficazes, o benznidazol (1971) e o nifurtimox (1965). Em geral, o primeiro ainda é o mais eficaz tripanocida, com sistemática comprovação em ensaios clínicos que o utilizaram como comparador para avaliação de novos fármacos. Entretanto, ainda há lacunas para o desenvolvimento de novas opções terapêuticas com menor toxicidade, visando a melhorar o perfil de segurança e o acesso ao tratamento.

Em relação ao tratamento das manifestações clínicas de miocardite e de insuficiência cardíaca é semelhante ao preconizado para os casos de miocardite de outras etiologias, incluindo medidas intensivas de suporte circulatório nos casos mais graves.

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Posicionamentos sobre doença cardiovascular na mulher

As Doenças Cardiovasculares (DCVs) são a maior causa de morte no Brasil. Nas mulheres, observa-se aumento da prevalência das DCV e de suas mortes após a menopausa, o que agrava as perspectivas em futuro próximo pelo envelhecimento e adoecimento da população feminina no Brasil.

Cerca de metade da mortalidade por DCV antes dos 65 anos pode ser atribuída à pobreza e às desigualdades sociais. Alimentação inadequada, baixa atividade física, consumo de álcool e tabagismo são outros importantes fatores de risco para as DCV em mulheres, mais prevalentes nas classes sociais menos favorecidas da população, incluindo as crianças e as adolescentes brasileiras. Assim, os programas de prevenção primária e secundária, bem como o maior acesso ao diagnóstico, nessa camada da população poderão ter impacto ainda maior na morbimortalidade por DCV. Além disso, outros fatores tradicionais incluem: diabetes mellitus, HAS, dislipidemia, síndrome dos ovários policísticos, uso de contraceptivo hormonal, doença hipertensiva da gravidez, eventos adversos da gravidez, riscos agregados às doenças inflamatórias e autoimunes e distúrbios depressivos.

Para avaliar o risco cardiovascular nas mulheres, devem-se considerar, além dos estratificadores de risco, os agravantes de risco associados com diabetes mellitus, os fatores potencializadores de risco e os fatores de risco inerentes ao sexo, a fim de instituir mudança do estilo de vida e recomendar medidas de prevenção primária das DCV, com o objetivo de identificar e tratar mais precocemente um maior número de mulheres em risco.

Doenças cardiovasculares nas mulheres

Doença isquêmica do coração

São bem definidos os mecanismos adicionais de isquemia coronariana, sendo mais apropriado falar em doença isquêmica do coração por se referir a diversas afecções coronárias geradoras de isquemia, como o infarto do miocárdio na ausência de obstrução arterial coronária, isquemia coronária não obstrutiva, dissecção espontânea da artéria coronária, doença microvascular, vasoespasmo coronariano e embolia/trombose coronariana.

Insuficiência cardíaca

Em relação à fisiopatologia da insuficiência cardíaca (IC), devido às respostas hormonais, as mulheres mostram diferenças quanto a epidemiologia, apresentação clínica, desfechos e tratamento da doença. Existem fenótipos de IC mais prevalentes em mulheres, como a síndrome de Takotsubo, e específicos, como a cardiomiopatia periparto. Porém, tanto na IC crônica quanto na aguda, ensaios clínicos voltados especialmente para mulheres são escassos e as evidências são provenientes de subanálise de grandes estudos em que as mulheres estão sub-representadas.

Arritmias

As mulheres têm mais taquicardia sinusal e taquicardia por reentrada nodal, sendo que a gravidez aumenta o risco das taquicardias supraventriculares. Ademais, na síndrome do QT longo tipo 2, é conhecido um maior risco de morte súbita entre as mulheres e um maior risco de pró-arritmia.

Nas mulheres, a morte súbita de etiologia cardíaca ocorre mais por causas não isquêmicas, sendo os homens mais reanimados e tratados com desfibrilador. O implante de cardiodesfibrilador implantável, como prevenção tanto primária quanto secundária, é mais comum nos homens, porém o risco de complicações relacionadas ao procedimento é maior nas mulheres.

Doença cardiovascular e câncer

A cardiotoxicidade é um desafio no tratamento dos cânceres na mulher, especialmente o de mama, por ser um dos mais frequentes e por levar à incidência aumentada de eventos cardiovasculares e de mortalidade cardiovascular e por todas as causas. Os riscos variam de acordo com o tratamento do câncer. Esse pode agredir o sistema cardiovascular levando a disfunção ventricular, desde assintomática e reversível até IC sintomática e irreversível, síndrome coronariana aguda, pericardite, miocardite, arritmias ventriculares, HAS, doença vascular periférica, entre outras.

Doença arterial periférica

A doença arterial periférica tem correlação com doença isquêmica do coração e, na sua vigência, o tratamento dos fatores de risco tradicionais é medida preventiva em ambos os sexos. O reconhecimento desses fatores específicos da mulher, como gravidez e suas complicações, ou de fatores predominantemente femininos pode permitir uma adequada estratificação de risco e a adoção de medidas de prevenção precoces.

Doenças valvares

O seguimento das mulheres portadoras de estenose aórtica ou doença valvar mitral exige cuidadoso e contínuo julgamento sobre o melhor modelo de tratamento. As decisões quanto à conduta clínica ou intervencionista dependem do diagnóstico anatômico e funcional da doença e da cuidadosa avaliação da paciente. Quando comparadas aos homens, considerando o mesmo grau de calcificação valvar, apresentam uma tendência a maior gravidade da estenose aórtica em razão da fibrose do aparelho valvar, que é mais pronunciada do que a calcificação. Apresentam também perfis distintos relacionados à apresentação clínica, à resposta ao tratamento e aos resultados após intervenção valvar.

Nas substituições valvares aórticas transcateter, mulheres são mais idosas e apresentam melhor função ventricular esquerda e menor prevalência de doença arterial coronariana; contudo, apresentam comorbidades, como diabetes mellitus e FA. Características anatômicas do sexo feminino, tais como menor distância entre os óstios coronarianos e o anel valvar e maior prevalência de calcificação valvar e da aorta, são responsáveis pela maior incidência de obstrução coronariana durante o procedimento. O menor diâmetro dos vasos periféricos também causa maiores complicações vasculares e sangramento.

Dentre as medidas preventivas nas doenças valvares, destacam-se a prevenção primária e secundária da doença reumática e a profilaxia antibiótica da endocardite infecciosa, notadamente no parto.

Diabetes mellitus, pré-eclâmpsia e doenças hipertensivas na gravidez

Diabetes gestacional está associada a complicações materno-fetais, tais como pré-eclâmpsia, prematuridade e morte perinatal. Mudança de estilo de vida, como atividade física regular na gravidez, na ausência de contraindicações obstétricas ou cardiovasculares, reduz os riscos dessas complicações de forma substancial.

A hipertensão na gravidez como fator de risco para DCV no futuro está bem embasada na literatura; mulheres primigestas que desenvolveram hipertensão gestacional tiveram maior risco de DCV no futuro, notadamente após a menopausa. Portanto, a melhor recomendação é iniciar a prevenção da pré-eclâmpsia e outras formas de hipertensão antes da gravidez, incluindo peso corporal adequado, dieta saudável e orientada, além de exercícios físicos regulares. Nas mulheres de alto risco, o uso do ácido acetilsalicílico no primeiro trimestre e a reposição de cálcio nas gestantes com baixa ingesta diária devem ser indicados.

Peculiaridades dos métodos propedêuticos nas mulheres

O eletrocardiograma nas mulheres difere em relação à magnitude dos sinais elétricos, com menor amplitude do QRS, do ponto J e da onda T e maior intervalo QT corrigido. A inversão da onda T anterior, isso é, além de V1, ocorre em cerca de 2,3% da população e é mais comum em mulheres, independentemente do status de atividade física. É um padrão benigno desde que ocorra em assintomáticas e de baixo risco. Além disso, alterações eletrocardiográficas são observadas em 45% das portadoras de implantes mamários: inversão de ondas T, depressão do segmento ST inferolateral, baixa progressão de R de V1-V4, intervalo QT prolongado e hipertrofia ventricular esquerda, podendo assim levar a interpretações enganosas.

No teste ergométrico, as mulheres mostram mais depressão do segmento ST de caráter falso-positivo e a acurácia varia com a probabilidade pré-teste de doença isquêmica do coração.

A medida da espessura médio-intimal para a reclassificação de risco pode ser utilizada em mulheres com pelo menos dois fatores de risco cardiovasculares. A presença de placa como fator agravante para estratificação de risco pode ser usada em mulheres com risco intermediário.

Mulheres com escore de cálcio maior que zero e calcificação arterial mamária têm risco de eventos isquêmicos maior do que homens. A angiotomografia coronariana evidencia o padrão não obstrutivo de coronárias, que é mais prevalente em mulheres.

A ressonância magnética cardíaca é excelente opção para as mulheres, especialmente em idade fértil, em gestantes e naquelas em tratamento de câncer de mama. Além disso, pode evidenciar alterações perfusionais e/ou miocárdicas, auxiliando no diagnóstico diferencial da dor torácica e sendo particularmente útil na abordagem da DIC em mulheres.

Ações para diminuir a morbimortalidade pela DCV nas mulheres

Dentre as ações sugeridas pelo posicionamento para diminuir a morbimortalidade pela DCV nas melhores, destacam-se: trabalhar coletivamente em defesa das metas globais para prevenção e controle de doenças crônicas não transmissíveis, especialmente as DCV nas brasileiras; estabelecer campanhas de prevenção cardiovascular, promovendo esforços consistentes para obter a meta de redução de 30% da taxa de mortalidade até 2030; elaborar e sugerir políticas governamentais para promover ambientes adequados para a redução da exposição ao risco, facilitando a adoção de hábitos saudáveis em ambientes escolares, de trabalho e de lazer, voltadas ao combate às DCV na mulher; atuar junto aos governos para o desenvolvimento e a aplicação de programa de prevenção cardiovascular, além da incorporação de tecnologias custo-efetivas para a redução da morbimortalidade por DCV nas mulheres; mobilizar os meios de comunicação para levar informações continuadas sobre a importância das DCV nas mulheres, seus principais fatores de risco e formas de prevenção, ampliando a divulgação para a população sobre a importância do diagnóstico precoce; fornecer o mais alto nível de educação médica continuada; promover o intercâmbio técnico-científico, cultural e social entre as cardiologistas do Brasil e do mundo; e fomentar o conhecimento científico necessário para aumentar a participação das mulheres nas ciências e nos eventos científicos das áreas de saúde e ciências afins.

É fundamental promover iniciativas para aumentar o conhecimento sobre a importância da saúde cardiovascular ao longo da vida da mulher. Além disso, é fundamental compreender melhor as disparidades locais na saúde cardiovascular das mulheres para definir políticas públicas e assistência à saúde, reduzir lacunas e promover a equidade de sexo na atenção à saúde brasileira.

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Diretriz Brasileira de Dispositivos Cardíacos Implantáveis 2023

Resultado da colaboração entre três instituições, a Diretriz Brasileira de Dispositivos Cardíacos Eletrônicos Implantáveis aborda o campo dos mecanismos da dose, conceito, fisiopatologia, métodos e critérios de diagnóstico de uma gama enorme de doenças e de arritmias que podem estar associadas.

Como a última diretriz foi publicado em 2007, ou seja, 16 anos atrás, houve muitos tópicos novos que sequer existiam na prática clínica no ano da diretriz anterior. Dentre esses, pode-se citar:

Terapia de Ressincronização Cardíaca

Um tema extremamente relevante na estimulação cardíaca com alguns aspectos importantes a serem comentados com a nova atualização:

Os maiores benefícios são em pacientes com bloqueio de ramo esquerdo. Nesses, quando o QRS é largo (≥150ms), os resultados são melhores.

Em pacientes que não tem bloqueio do ramo esquerdo, como, por exemplo, nos que tem bloqueio do ramo direito, a recomendação é IIa quando o QRS ≥150ms e IIb quando está entre 130 – 149 ms. Essas são considerações bastante relevantes em um país com muitos chagásicos.

Tabela 1: Recomendações para indicação de terapia de ressincronização cardíaca (TRC) em pacientes com ritmo sinusal. TRC: terapia de ressincronização cardíaca; ICFEr: insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida; BRE: bloqueio de ramo esquerdo; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; TFO: terapia farmacológica otimizada; NYHA: New York Heart Association; CF: classe funcional. Tabela retirada de Teixeira e colaboradores (2023).

Terapia de Ressincronização Cardíaca em pacientes com fibrilação atrial

Os dados sobre a TRC em pacientes com FA são limitados, mas sugerem benefícios ainda que sejam menores que em pacientes em ritmo sinusal. Isso ocorre devido a algumas peculiaridades relacionadas com a FA, tais como perda do sincronismo atrioventricular, maior risco de falha da estimulação ventricular sincronizada devido à dificuldade de controle da frequência cardíaca e ocorrência de batimentos de fusão e pseudofusão, maior incidência de disparo de choques de CDI (apropriados ou inapropriados), além de maior incidência de hospitalização e mortalidade.

Diversos estudos relataram o benefício da TRC em pacientes com FA quando a fração de ejeção do ventrículo esquerdo for< 50% associado a ablação do nó atrioventricular. Nos demais cenários, os médicos devem-se sempre se preocupar para que a porcentagem do pacing ventricular seja alta.

Tabela 2: Recomendações para indicação de terapia de ressincronização cardíaca (TRC) em pacientes com fibrilação atrial. CF: classe funcional; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; NYHA: New York Heart Association; TRC: terapia de ressincronização cardíaca. Tabela retirada de Teixeira e colaboradores (2023).

Upgrade de Marca-passo Convencional

Pacientes submetidos à estimulação crônica do ventrículo direito por marca-passo (MP) convencional ou cardioversores-desfibriladores implantáveis (CDI) podem evoluir com disfunção sistólica progressiva do ventrículo esquerdo (VE) em decorrência de dissincronia elétrica e mecânica. Dados de registros indicam que a disfunção do VE induzida por MP pode ocorrer em 12 a 30% dos pacientes. Para esse diagnóstico, deve-se documentar alta taxa de estimulação ventricular, afastadas outras causas de disfunção de VE, como isquemia miocárdica, valvopatias e arritmias sem controle adequado.

Na Indicação de Marca-passo Antibradicardia (1º Implante)

O possível efeito deletério da estimulação ventricular com MP convencional pode justificar a indicação de terapia de ressincronização cardíaca (TRC) como opção de escolha para o tratamento de bradicardias.

Estudos sugeriram que a disfunção de VE induzida por MP (12 a 30%) é maior quando a taxa de estimulação ventricular excede a 40%, ou até mesmo 20%. A FEVE prévia ao implante e a duração do QRS também foram preditores da ocorrência de disfunção ventricular induzida por MP.

Indicação de Cardio-desfibrilador Implantável (TRC-D)

O implante de CDI está indicado em diferentes condições clínicas como estratégia de prevenção primária e secundária de morte súbita. Muitos desses pacientes apresentam também disfunção de VE e bloqueio de ramo esquerdo (BRE), atendendo a critérios de indicação para TRC. Desta forma, há pacientes que podem se beneficiar de ambas as terapias (TRC-D).

A decisão clínica sobre implante de TRC-D em pacientes com indicação de CDI deve levar em consideração o padrão de bloqueio intraventricular e a duração do complexo QRS. Resultados de metanálises apontam que os benefícios da TRC se restringem principalmente a pacientes que apresentam padrão de bloqueio de ramo esquerdo. Em um estudo, o benefício sobre desfecho primário ocorreu apenas nos pacientes com QRS > 150ms. Nos pacientes com padrão de BRE, houve relação contínua entre duração do QRS e benefício clínico. Nos pacientes com padrão não BRE, o benefício ocorreu apenas com QRS > 160ms.

Tabela 3: Recomendações para indicação de terapia de ressincronização cardíaca (TRC) em pacientes com indicação de cardioversor-desfibrilador implantável (CDI). BRE: bloqueio de ramo esquerdo; CDI: cardioversor-desfibrilador implantável; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IC: insuficiência cardíaca; TMO: terapia medicamentosa otimizada; TRC: terapia de ressincronização cardíaca; VE: ventrículo esquerdo. Tabela retirada de Teixeira e colaboradores (2023).

Estimulação Direta do Sistema Excito-condutor Cardíaco

A TRC é um tratamento não farmacológico bem estabelecido para tratamento de pacientes com IC sintomáticos, FEVE reduzida e QRS largo. A despeito do avanço dessa modalidade terapêutica, ainda se observa taxa de não respondedores de 20 a 40%.218 Neste cenário, a estimulação direta do sistema de excito-condutor cardíaco (feixe de His ou ramo esquerdo) pode ser a alternativa útil.

Tabela 4: Recomendações para indicação de estimulação direta do sistema excito-condutor cardíaco como alternativa à terapia de ressincronização cardíaca (TRC). BAV: bloqueio atrioventricular; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; IC: insuficiência cardíaca; MP: marca-passo; TRC: terapia de ressincronização cardíaca. Tabela retirada de Teixeira e colaboradores (2023).

Recomendações para Indicação de Cardioversor-desfibrilador Implantável

Prevenção primária: Miocardiopatia Isquêmica

A morte súbita (MS) causada por arritmias ventriculares é uma das principais causas de morte em pacientes com IC com FEVE reduzida (ICFER), em especial na população de pacientes com cardiopatia isquêmica em que a incidência de fibrose miocárdica ventricular e, consequentemente, circuitos de reentrada é mais prevalente.

As recomendações clássicas foram mantidas, mas houve novidades, como a indicação de CDI como ponte para TX cardíaco ou dispositivos de assistência ventricular. Tabela retirada de Teixeira e colaboradores (2023).

Tabela 5: Recomendações para indicação de cardioversor-desfibrilador implantável (CDI) na prevenção primária na cardiopatia isquêmica. CDI: cardioversor-desfibrilador implantável; CF: classe funcional; IAM: infarto agudo do miocárdio; DAV: dispositivo de assistência ventricular; EEF: estudo eletrofisiológico; FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo; TVNS: taquicardia ventricular não sustentada; TVS taquicardia ventricular sustentada.

Prevenção primária: CDI na Miocardiopatia não isquêmica

A IC é uma condição clínica muito prevalente, com elevada morbidade e mortalidade. Em 20% a 30% dos casos, a etiologia é definida como não isquêmica, o que significa que há ausência de lesões significativas na angiografia coronariana ou resultado negativo em método de imagem para investigação de isquemia. A causa da disfunção ventricular esquerda pode ser desconhecida, sendo chamada miocardiopatia dilatada idiopática, ou pode ser atribuída a fatores como infecção viral, hipertensão arterial sistêmica, exposição a agentes potencialmente tóxicos (quimioterápicos, álcool), doença de Chagas, doenças infiltrativas, periparto, valvulopatias, doenças genéticas e autoimunes.

Mesmo que avanços na terapêutica da miocardiopatia não isquêmica (MNI) tenham trazido redução significativa da mortalidade nas últimas décadas, a morte súbita cardíaca (MSC) permanece como problema importante, sendo responsável por 30% dos óbitos. As estratégias de prevenção primária de MSC nos pacientes com MNI incluem tratamento farmacológico, CDI e TRC. Ensaios clínicos randomizados demonstraram que o emprego de fármacos (betabloqueadores, sacubitril/valsartana e espironolactona) reduz significativamente as taxas de MSC neste grupo de pacientes

A estratificação de risco inclui avaliação clínica e laboratorial. Quanto pior a classe funcional (CF, NYHA), maior o risco absoluto de mortalidade geral e de MSC.

A redução da FEVE é considerada o principal fator de risco para MSC e mortalidade total em pacientes com IC. Por isso, em pacientes com FEVE ≤ 35%, tratamento clínico otimizado, CF NYHA II-III e expectativa de vida >1 ano é indicado o CDI na prevenção primária.

Além disso, também é indicado em CDI em pacientes com alterações genéticas de alto risco associado a 2 ou mais fatores de risco.

Para ler mais recomendações, acesse o documento completo clicando aqui.

Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial

A hipertensão arterial (HA) é uma condição multifatorial, que depende de fatores genéticos/ epigenéticos, ambientais e sociais, caracterizada por elevação persistente da pressão arterial (PA), ou seja, PA sistólica (PAS) maior ou igual a 140 mmHg e/ou PA diastólica (PAD) maior ou igual a 90 mmHg, medida em pelo menos duas ocasiões diferentes, na ausência de medicação anti-hipertensiva.

Por se tratar de condição frequentemente assintomática, a HA costuma evoluir com alterações estruturais e/ou funcionais em órgãos-alvo, como coração, cérebro, rins e vasos. Ela é o principal fator de risco modificável com associação independente, linear e contínua para doenças cardiovasculares (DCV), doença renal crônica (DRC) e morte prematura.

Por se tratar de condição frequentemente assintomática, a HA costuma evoluir com alterações estruturais e/ou funcionais em órgãos-alvo, como coração, cérebro, rins e vasos. Ela é o principal fator de risco modificável com associação independente, linear e contínua para doenças cardiovasculares (DCV), doença renal crônica (DRC) e morte prematura.

Em relação as principais mudanças, pode-se citar:

Mudança na classificação da pré-hipertensão:

Em relação a classificação, os estágios 1, 2 e 3 não tiveram mudanças. Enquanto isso, a PA antes considerada normal passou a ser considerada ótima e os valores que eram considerados na definição de pré-hipertensão passaram a ser divididos entre PA normal e pré-hipertensão.

A pré-hipertensão foi definida por PAS entre 130 e 139 mmHg e/ou pressão arterial diastólica (PAD) entre 85 e 89 mmHg.

Tabela 6:  Classificação da pressão arterial de acordo com a medição no consultório a partir de 18 anos de idade. HA: hipertensão arterial; PA: pressão arterial; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica. *A classificação é definida de acordo com a PA no consultório e pelo nível mais elevado de PA, sistólica ou diastólica. **A HA sistólica isolada, caracterizada pela PAS ≥ 140 mmHg e PAD < 90 mmHg, é classificada em 1, 2 ou 3, de acordo com os valores da PAS nos intervalos indicados. ***A HA diastólica isolada, caracterizada pela PAS < 140 mmHg e PAD ≥ 90 mmHg, é classificada em 1, 2 ou 3, de acordo com os valores da PAD nos intervalos indicados. Tabela retirada de Barroso e colaboradores (2023).

Monitorização residencial da pressão arterial

A monitorização residencial da pressão arterial é realizada com um protocolo específico que consiste na obtenção de três medidas da PA pela manhã (antes do desjejum e da tomada de medicamento) e três medidas à noite (antes do jantar) durante 5 dias consecutivos ou duas pela manhã e à noite durante 7 dias.

Os valores de referência para MRPA mudaram e a nova diretriz considera hipertensão arterial quando os valores são maiores ou iguais que 130/80 mmHg.

Metas terapêuticas

Um dos objetivos específicos do tratamento do paciente hipertenso é obter o controle pressórico alcançando a meta de PA previamente estabelecida. Tal meta deve ser definida individualmente, sempre considerando a idade e a presença de DCV ou de seus fatores de risco. De forma geral, deve-se reduzir a PA visando a alcançar valores menores que 140/90 mmHg e não inferiores a 120/70 mmHg.

As metas terapêuticas na nova diretriz para pacientes de baixo ou moderado risco são uma de PA < 140/90 mmHg e < 130/80 mmHg para os de alto risco, mas com uma especificidade, a PA sistólica deve variar entre 120-129 e a diastólica 70-79. Foi acrescentado também uma meta terapêutica para pacientes idosos, que foram subdivididos em hígidos com meta pressórica de 130-130 de PAS e 70-79 para PAD. Já os idosos frágeis PAS entre 140-149 e PAD 70-79.

Tratamento medicamentoso

A nova atualização orientou iniciar o tratamento com intervenções no estilo de vida para pacientes hipertensos no estágio 1 com risco baixo ou pré-hipertensos com risco cardiovascular alto, aguardando 3 meses seus efeitos. Deve-se utilizar a monoterapia em pacientes estágio 1 e baixo risco ou com pré-hipertensos de risco cardiovascular alto ou para indivíduos a partir de 80 anos e/ou idosos frágeis com PAS ≥ 160mmHg. E a terapia combinada foi sugerida para hipertensos estágio 1 de moderado e alto risco de para pacientes estágios 2 e 3.

Figura 2: Fluxograma do tratamento medicamentoso.