Estudos feitos por pesquisadoras do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP mostram que ratos desmamados precocemente apresentam um aumento nos indicadores de crescimento do estômago e uma retração nas taxas de crescimento do intestino. “Essas mudanças, que podem se estender até a fase adulta, se tornam gatilhos para o desenvolvimento de algumas doenças gastrointestinais”, afirmou a professora Patrícia Gama, coordenadora do Laboratório de Biologia dos Epitélios Digestivos e diretora do ICB.
Isso porque o crescimento do estômago pode levar o órgão a ter maior número de células com modificações gênicas. “Já a diminuição da mucosa do intestino pode dificultar a absorção de moléculas, principalmente durante o crescimento, e levar a complicações, que incluem o metabolismo de glicose”, explica ela sobre o estudo, recentemente publicado no Journal of Cellular Physiology.
Essas conclusões foram obtidas com um grupo de ratos que teve a amamentação interrompida ao completar 15 dias do nascimento, sendo substituída por pasta de ração, e que foram avaliados após o 60º dia de vida, o que corresponde ao início de sua fase adulta. Os resultados, observados em análises genéticas e de bioinformática, foram comparados com um outro grupo de ratos que seguiu com a amamentação pelo período ideal, que é de 21 dias. Nesse grupo não houve alterações no tamanho dos órgãos que apontem para possíveis problemas.
Os ratos ainda foram reavaliados após o 120º dia, período da transição da vida adulta para o envelhecimento. “Já na transição para o envelhecimento, foi observada uma pequena melhora nos indicadores de crescimento do intestino e do estômago dos ratos cuja amamentação foi interrompida, indicando certa adaptação. No entanto, ela foi pouco significativa para atestar que foi possível evitar complicações gastrointestinais”, detalha.
Segundo a professora, o estudo contribui para o entendimento dos efeitos causados pelo desmame precoce experimentalmente, e adiciona informações importantes para a conduta de amamentação em outras espécies, incluindo os bebês.
Estudos em humanos
Para a professora, que estuda a relação entre o sistema digestório e a alimentação há mais de 30 anos, os modelos animais já foram bastante explorados. Agora são necessários estudos clínicos com humanos, tanto para verificar se esses efeitos se repetem em bebês e crianças como para investigar melhor quais são as complicações que estão atreladas às mudanças gastrointestinais.
“Estamos planejando um estudo com dados de bancos públicos, de adultos e de pessoas que estão em uma fase de envelhecimento. A proposta é fazer uma análise genômica dos pacientes que tiveram o desmame precoce para verificar, com ferramentas de bioinformática, se eles têm mudanças genéticas que correspondem com doenças gastrointestinais ou predisposição a elas. Também queremos identificar se existem novas mudanças genéticas que estão relacionadas com essas doenças, visando tratamentos mais personalizados no futuro”.