Tecnologia e saúde

Novo medicamento reduz declínio cognitivo da doença de Alzheimer

Impacto inédito na cognição ainda é modesto, e medicamento tem efeitos colaterais significativos, mas cientistas celebram resultados

Um novo medicamento experimental para a doença de Alzheimer chamado lecanemab, desenvolvido pela farmacêutica japonesa Eisai e pela americana Biogen, proporcionou uma redução inédita de 27% no declínio cognitivo. Embora o impacto ainda seja modesto, e o remédio tenha provocado efeitos colaterais significativos em parte dos participantes, cientistas consideram os resultados como um ponto de virada no tratamento da doença.

Os dados preliminares dos testes clínicos de fase 3, última etapa dos estudos, já haviam sido divulgados pelos laboratórios em setembro. Porém, foram confirmados nesta terça-feira durante apresentação na Conferência de Ensaios Clínicos na Doença de Alzheimer (CTAD), evento que ocorreu nos Estados Unidos, com a publicação simultânea do trabalho na revista científica New England Journal of Medicine.

No estudo, 1.795 participantes em fase inicial da doença, recrutados em 235 centros de pesquisa na América do Norte, Europa e Ásia, foram divididos em dois grupos, em que parte recebeu o novo remédio, e os demais, placebo. A dosagem do medicamento foi de 10 mg por kg, a cada duas semanas, de forma injetável. Eles avaliaram o impacto do tratamento após um período de 18 meses.

O lecanemab é um anticorpo monoclonal que elimina as placas da proteína beta-amiloide formadas no cérebro. O acúmulo da substância, embora alvo de polêmicas recentes, é compreendido hoje como uma das causas conhecidas do Alzheimer. As tomografias comprovaram o potencial, mostrando uma redução do excesso da substância no órgão a partir de três meses do início do tratamento.

No entanto, ainda era um ponto de debate entre os cientistas até que ponto essa redução é eficaz em reduzir os sintomas da doença, com outros remédios de atuação semelhante fracassando nos estudos. Porém, entre os voluntários que receberam o lecanemab, foi de fato observada uma redução inédita no declínio cognitivo característico da doença de Alzheimer - como a incapacidade de realizar tarefas do dia a dia, a perda de memória, entre outras manifestações - de 27%.

— É de fato a primeira medicação que de fato teve um resultado positivo e trouxe consistência dos dados. Teve um desempenho muito bom em retirar as proteínas beta-amiloide e um resultado clínico positivo, embora modesto. O grande desafio agora é saber se esse resultado se mantém a longo prazo. Mas certamente vai ser um divisor de águas nesse momento em que estamos vendo novas formas de tratamento — avalia o neurologista do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP) Adalberto Studart Neto, membro da Academia Brasileira de Neurologia (ABN).

A droga é vista como um ponto de virada, mas ainda guarda algumas ressalvas além da baixa eficácia, como a presença de efeitos colaterais significativos. No geral, cerca de 12,6% dos participantes que receberam o medicamento tiveram anormalidades relacionadas à beta-amiloide no cérebro que causam edemas ou sangramentos cerebrais – e foram afastados do estudo. Houve uma incidência semelhante de óbitos entre os indivíduos que receberam placebo e o lecanemab, e os laboratórios afirmam que os eventos não foram relacionados ao remédio.