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Carcinoma basocelular

É a neoplasia maligna mais comum e sua incidência vem aumentando nos últimos anos.

Autor/a: Dr. José Jabur da Cunha

Indice
1. Texto principal
2. Referências Bibliográficas
Etiopatogenia


O CBC é a neoplasia maligna mais comum e a incidência e os custos associados vêm aumentando nos últimos anos.1

Um grande estudo norte-americano (1986-2006) mostrou o aumento da incidência do CBC de 519 para 1.019 casos por 100.000 pessoas/ano em mulheres e de 606 para 1.488 casos por 100.000 pessoas/ano em homens.2 Aumentos similares vêm sendo demonstrados também em diversos outros países e acredita-se que este aumento deva continuar até 2040.3

Os fatores de risco para CBC incluem pele clara, exposição solar, idade avançada, imunossupressão e uma história pessoal de câncer de pele não melanoma. Especificamente, a radiação ultravioleta (RUV) induz danos ao DNA da pele que levam ao desenvolvimento do câncer de pele.

A maioria das evidências sugere que a exposição solar intermitente e intensa (bronzeamento recreativo, exposição ocupacional e queimaduras solares na infância) seja um fator de risco predominante no desenvolvimento do CBC.4

Mutações nos genes PTCH1 e/ou Smoothened são encontradas nos CBCs e permitem a ativação aberrante da via sonic hedgehog (SHH), que é uma via impulsionadora do crescimento neoplásico.6

Dez por cento dos CBCs esporádicos exibem uma mutação de ativação em SMO, enquanto 90% são causados por uma mutação de inativação em PTCH.7 Este último também é responsável por CBCs associados a síndromes, como síndrome do nevo basocelular e xeroderma pigmentoso.

Classificação

O CBC é habitualmente classificado de acordo com seu aspecto clínico e subtipo histológico. Nodular, superficial, nódulo-cístico, fibroepitelial, pigmentado e esclerodermiforme são subtipos com achados clínicos e histopatológicos bem definidos, conforme descritos na Tabela 1.


Tabela 1 - Características clínicas e histopatológicas dos subtipos do CBC.

No entanto, na prática diária, a classificação do CBC nestes subtipos muitas vezes é difícil e isto se dá por diversos fatores:

• CBCs são altamente polimórficos e muitas vezes difíceis de classificar em um desses subtipos padrão;

• frequentemente não se verifica uma conformidade entre o aspecto clínico e o subtipo histológico;

• é comum a identificação de mais de um subtipo histológico no mesmo tumor.

Existem outras formas complementares de se classificar o CBC. Uma forma é a proposta pelo National Comprehensive Cancer Network (NCCN) e largamente utilizada na prática clínica, que classifica o CBC de acordo o risco de recidiva. Como se sabe, o risco de metástases a distância no CBC é muito baixo, portanto, estamos falando principalmente de recidiva local. Ou seja, o risco do tumor recorrer após ter sido tratado.

A classificação de risco do CBC visa orientar o tratamento a ser instituído de acordo com risco de recidiva do tumor.

O NCCN utiliza critérios clínicos e histopatológicos para classificar o CBC em Baixo Risco ou Alto Risco conforme tabela 2. Basta um critério de alto risco para o tumor ser classificado como de Alto Risco.


Tabela 2 - Características clínicas e histopatológicas dos subtipos do CBC.

Diagnóstico

O diagnóstico se inicia pela suspeita clínica. Devido à alta prevalência do CBC em nosso meio, deve-se sempre suspeitar do diagnóstico deste tumor, especialmente em pacientes de pele clara, olhos claros, histórico de câncer de pele e que apresentam sinais de fotodano cutâneo.

A história típica é de uma lesão de crescimento lento, geralmente por meses ou anos, que não cicatriza e que sangra com facilidade. Estas lesões são frequentemente localizadas (mas não exclusivas) em áreas cronicamente expostas ao sol, como rosto, pescoço, colo, couro cabeludo e face externa dos membros.

Tipicamente se apresenta como uma pápula perlácea brilhante e bem definida com telangiectasias superficiais. É comum a ulceração central. No entanto, o CBC é bastante polimorfo e outras formas clínicas são comuns.

O próximo passo depois da suspeita clínica é a realização da dermatoscopia. A precisão diagnóstica através da dermatoscopia para o diagnóstico do CBC varia de 95% a 99%.8 Os critérios dermatoscópicos descritos para o CBC estão listados na tabela 3. A confirmação diagnóstica se dá pela biópsia.


Tabela 3 - Achados dermatoscópicos associados ao diagnóstico de CBC.

A realização da biópsia de pele é o procedimento padrão para o diagnóstico da CBC e a orientação do tratamento deve ser realizada como regra.

Tratamento

Enquanto os CBCs crescem lentamente e com risco muito baixo de metástases, uma pequena porção progride para tumores avançados e de difícil resolução. Estes casos geralmente ocorrem como resultado de negligência, acarretando tratamentos mutilantes e com taxas de cura muito reduzidas.

Existem diversas opções disponíveis para o tratamento do CBC: excisão cirúrgica convencional, cirurgia micrográfica de Mohs (CMM), crioterapia, curetagem e eletrocoagulação (CTG/ECG), aplicação tópica de imiquimode ou 5-fluorouracil, terapia fotodinâmica (PDT), radioterapia e terapias sistêmicas.

O dermatologista deve sempre avaliar os fatores de risco para recorrência do CBC, as condições clínicas do paciente e as modalidades terapêuticas disponíveis.

Estas opções podem ser didaticamente divididas em: tratamentos cirúrgicos, tratamentos tópicos, destrutivos, radioterapia e terapia sistêmica.

Tratamentos cirúrgicos

> Excisão cirúrgica convencional

O objetivo é eliminar o tumor por completo, incluindo sua porção clinicamente aparente e também sua porção inaparente chamada de extensão subclínica do tumor. Para isso, aplica-se uma margem de segurança pré-determinada, e a peça cirúrgica é avaliada somente após o término da cirurgia, em parafina pelo exame anatomopatológico padrão.

> Cirurgia Micrográfica de Mohs (CMM)

A CMM é uma técnica cirúrgica microscopicamente controlada, que permite a avaliação histológica de 100% das margens operatórias durante o procedimento cirúrgico.9 Na CMM, o tumor é removido camada por camada, e cada camada é examinada microscopicamente no intraoperatório, com a remoção continuando até que o tumor seja extirpado por completo. É, portanto, adequada para tumores com alto risco e em áreas cosmeticamente sensíveis.

Em um estudo prospectivo randomizado que comparou a excisão convencional com CMM, a recorrência em 10 anos para CBC primário foi de 12,2% após a excisão padrão e 4,4% após a CMM. Para CBCs recorrentes, a recorrência cumulativa em 10 anos foi de 13,5% e 3,9% respectivamente.10

Terapias tópicas e destrutivas

O exame histológico não é possível usando técnicas de tratamento tópico ou destrutivo. Além disso, as partes mais profundas dos tumores podem não ser alcançadas por causa dos limites de penetração inerentes ao método (ex.: PDT, terapias tópicas) ou somente aceitando um risco grande de cicatrizes inestéticas (ex.: crioterapia ou CTG/ ECG profundas).

Curetagem e Eletrocoagulação/Crioterapia

Ambos são tratamentos destrutivos que podem ser indicados em CBCs de baixo risco localizados em regiões fora da face. São terapias que dependem da habilidade e experiência do cirurgião com taxas de cura variando de 3% a 20% para CTG/ECG, e 6% a 39% para a crioterapia, dependendo das características do tumor.11

Imiquimode

Imiquimode é um imunomodulador que se liga aos receptores toll-like 7 e 8 e ativa o fator nuclear kappa B. Esta cascata induz citocinas pró-inflamatórias, ativa o sistema imune inato e adaptativo e induz a apoptose de células tumorais.12 É aprovado na Europa e nos EUA para o tratamento de pequenos CBCs em adultos imunocompetentes, aplicado 5 vezes por semana por 6 semanas.

5-Fluorouracil

O 5-fluorouracil (5-FU) é um antimetabólico e antineoplásico que interfere na síntese de DNA. Formulado em creme a 5% é aplicado topicamente para o tratamento do CBC superficial.

Um ensaio clínico randomizado comparou 5-FU com imiquimode e PDT em pacientes com CBC superficial com seguimento por 5 anos. A estimativa geral de sucesso do tratamento em 5 anos foi de 62,7% para PDT, 80,5% para imiquimode e 70,0% para 5% de 5-FU, confirmando a superioridade do imiquimode no tratamento do CBC superficial.13

Terapia Fotodinâmica

A PDT combina o uso de um fotossensibilizante e uma fonte de luz para destruir seletivamente as células pré-cancerosas da pele. Os dois mais utilizados são ácido 5-aminolevulínico (ALA) e o metilaminolevulinato (MAL). A PDT pode ser considerada em pacientes com CBCs pequenos superficiais ou nodulares (Espessura < 2 mm), onde a cirurgia não é adequada ou contraindicada.11


Radioterapia

As taxas gerais de cura relatadas em 5 anos são 91-93% para CBCs não tratados anteriormente e 86-91% para CBCs recorrentes.14 No entanto, CBCs quando recorrem em áreas de RT prévia, tendem a apresentar evolução mais agressiva. Outras considerações são riscos de radiodermite crônica e surgimento de neoplasias secundárias à RT no local. Devido a essas considerações, a RT é preferida em pacientes com mais de 60 anos, com tumores de alto risco e não elegíveis para tratamento cirúrgico. Além disso, pode ser indicada como terapia adjuvante pós-operatória em tumores agressivos.

Terapia sistêmica

Vismodegib e sonidegib são inibidores específicos de uma proteína oncogênica chamada Smoothened aprovada pelo FDA e EMA, e ambos são indicados para o tratamento de pacientes com CBC localmente avançado com impossibilidade de terapia curativa com cirurgia e radioterapia. Vismodegib é também aprovado para CBC metastático.

Acompanhamento e prevenção


Pacientes com histórico de CBC apresentam 30% a 50% de chance de desenvolver um segundo tumor. Isto representa um aumento de 10x quando comparado à população geral. Ao mesmo tempo, há também risco aumentado de desenvolver carcinoma espinocelular e melanoma.16

Desta forma, estes pacientes devem ser acompanhados pelo dermatologista visando exame do local tratado previamente para avaliar recidiva da lesão, e exame dermatológico completo pelo alto risco de uma nova neoplasia maligna da pele.

O autoexame dermatológico deve ser encorajado, em busca de lesões novas e suspeitas. Além disso, o paciente deve ser orientado sobre fotoproteção adequada.


O paciente com câncer de pele apresenta ainda preocupações com a sua qualidade de vida. Presença de cicatrizes e desfigurações, medo de novos cânceres de pele e ansiedades quanto à exposição solar e prática de atividades ao ar livre17 são questões que devem ser abordadas durante o acompanhamento.

Pacientes com múltiplos CBCs podem se beneficiar de medidas de quimioprevenção. Um ensaio clínico demonstrou a eficácia da nicotinamida (500 mg duas vezes ao dia) na redução da incidência do CBC de 20% em 12 meses.18 Além disso, o tratamento de campo cancerizado com terapias tópicas como imiquimode, 5-FU e PDT podem ser recomendados.


O autor

 Dr. José Jabur da Cunha

Dermatologista e Cirurgião Micrográfico. Coordenador do setor de Cirurgia Dermatológica da Santa Casa de São Paulo. Membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica. Membro da American Society for Dermatologic Surgery. Chefe de equipe de retaguarda de Dermatologia do Hospital Samaritano de São Paulo.