Neurociência | 01 ABR 24

Pesquisadores descobrem neurônios que deflagram a busca frenética por alimentos, mesmo sem fome

Em estudo com camundongos, cientistas usaram técnica que combina estímulo luminoso e bioengenharia para ativar seletivamente um conjunto de células nervosas escondido na base do cérebro.

Pela primeira vez, pesquisadores identificaram um conjunto de células nervosas diretamente relacionadas com a manifestação do comportamento de busca compulsiva por comida. Trata-se de uma população de neurônios escondida em uma região chamada substância cinzenta periaquedutal, que fica na base do cérebro, em direção oposta ao córtex pré-frontal. Também conhecidas como células VGAT (do inglês vesicular GABA transporter), elas usam o neurotransmissor GABA (ácido gama-aminobutírico), que desempenha um papel importante na regulação da atividade neuronal. Estão presentes em várias áreas do cérebro e da medula espinhal, contribuindo para a modulação do humor, do sono, da ansiedade e da resposta ao estresse, entre outras funções.

“Não se conhecia, porém, a relação das células VGAT na região cinzenta periaquedutal com a alimentação”, descreveu o pesquisador Avishek Adhikari, do Departamento de Psicologia da Universidade da California em Los Angeles (UCLA). No Laboratório de Neurociências, sob a liderança de Adhikari, foram feitos estudos para entender como o cérebro coordena a constelação de mudanças relacionadas aos comportamentos emocionais, com foco no medo e na ansiedade.

A descoberta foi acidental. “Estávamos investigando os neurônios da substância cinzenta periaquedutal com interesse em ansiedade e não em alimentação”, revelou o autor principal do trabalho, o neurocientista brasileiro Fernando Reis, da UCLA. A hipótese inicial dos pesquisadores era de que a ativação das células VGAT deveria inibir reações de medo e pânico. “Quando as ativamos em camundongos, vimos que isso não só não acontecia como houve uma busca desenfreada por alimentos”, conta Reis, que decidiu aprofundar o estudo com a realização de mais testes.

A nova bateria de experimentos trouxe revelações surpreendentes. Mesmo em animais completamente saciados, sem fome alguma, a ativação dessas células deflagrou uma busca frenética por alimentos e os fez comer mais do que seria normal. O contrário também aconteceu. Animais deixados propositalmente com muita fome comeram menos quando os neurônios VGAT foram inibidos.

Durante os testes, os cientistas observaram que os camundongos pareciam gostar da estimulação recebida. “Eles ficavam mais tempo do lado da caixa onde recebiam estímulos para ativar as células VGAT periaquedutais. Acreditamos que a busca descontrolada por comida produz sensações positivas, agradáveis e prazerosas, de recompensa”, observa Reis.

Os camundongos também se dispuseram a superar obstáculos para alcançar os alimentos. “Eles subiram uma pequena grade de arame que dava choques de baixa voltagem para alcançar pedaços de nozes. Não é algo desejável, mas o ímpeto de chegar à comida foi maior do que o desconforto”, relatou Adhikari.

Estímulos luminosos

O circuito neuronal estimulado pelos pesquisadores corresponde a cerca de 10% a 12% das células nervosas contidas na substância periaquedutal cinza. A tecnologia escolhida para ativá-las seletivamente foi a optogenética. “O problema que a optogenética tenta resolver é como manipular a atividade de um subgrupo de células em uma área específica do cérebro”, explica Adhikari, que fez seu pós-doutorado no laboratório da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, onde essa técnica foi desenvolvida.

 

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